Em entrevista exclusiva à Revista do Choro, o bandolinista e compositor Hamilton de Holanda comenta sua trajetória, momentos marcantes da carreira, seus projetos e a relação com parceiros musicais
Por Leonor Bianchi
Reconhecido internacionalmente por seu virtuosismo musical nato, o bandolinista e multi-instrumentista Hamilton de Holanda estreia amanhã seu novo trabalho; o Pelo Brasil. Contemplado pelo programa Petrobras Cultural, o projeto reúne 15 espetáculos por todo país, os quais darão origem a um CD e um DVD que serão lançados em março de 2015, seguidos de turnê nacional. Um dos responsáveis pelo movimento que em 2000 levou à criação da lei do Dia Nacional do Choro – comemorado no Brasil em 23 de abril, dia do nascimento de Pixinguinha -, o bandolinista e expoente do choro e da música brasileira Hamilton de Holanda é o protagonista de nossa matéria de capa desta edição.
Matéria esta, que nos revelou um instrumentista tocado profundamente pela expressão artística que escolheu e pela qual foi escolhido: a música. Para Hamilton de Holanda não há distinção entre os momentos de estudo e os momentos de tocar seu instrumento. Sua relação com a música, com o bandolim, é tão íntima e tão espontânea e natural, que não comporta dicotomias e classificações. Estamos diante de um músico único, completo, sensível, preparado, atual, contemporâneo… Um instrumentista do século XXI, que não diferencia o momento de estudo do ‘momento de tocar o instrumento’. Para o bandolinista, a relação ‘trabalho e prática de estudo do instrumento’ assemelha-se a dos índios, se quisermos traçar um paralelo à forma como organizam seu cotidiano com as relações de trabalho e a produção artística. Para eles não há distinção entre trabalho e produção artística, não há fragmentação da rotina cotidiana em ‘o trabalho’ e ‘o fazer arte’; o trabalho e o fazer arte são uma única coisa, integram-se e não podem existir separadamente. Assim percebemos a arte do bandolinista brasileiro Hamilton de Holanda, amalgamada misticamente em sua alma e espírito.
– Estudar e tocar para mim são a mesma coisa. Quando estou estudando, estou tocando, quando estou tocando, estou estudando. As fases da minha vida foram mudando e eu fui adaptando a forma de estudar a essas fases. Nunca gostei de estudar horas, sempre quis fazer um estudo em que eu sentisse a música entrando em minha mente e em meu coração e, obviamente, os dedos teriam que aprender tudo isso. Era a união de três coisas: da técnica, da mente e do coração – revela Hamilton de Holanda.
‘Pelo Brasil’ estreia hoje em Brasília
A partir de 14 composições autorais e inéditas, como Carimbobó, O jumento e a capivara, Sambaíba, O Amor e a canção, A escola e a bola, Chama lá e Frevinho, o projeto Pelo Brasil propõe uma travessia musical que exalta alguns dos ritmos brasileiros mais representativos, como o choro, o baião, o maracatu, o samba, o bumba-meu-boi, a moda de viola e o chamamé. O bandolinista desenvolveu um repertório bem brasileiro dando protagonismo ao bandolim de 10 cordas em músicas que referenciam as múltiplas culturas do Brasil. A proposta é apresentar os vários ritmos brasileiros a partir da escola do bandolim de 10 cordas em um concerto multimídia onde no palco brilham Hamilton e seu bandolim.
O projeto Pelo Brasil está dividido em duas etapas: a primeira permite ao instrumentista apresentar 12 ensaios abertos. Numa obra em progresso, esse momento inicial serve para afinar junto a sua equipe e ao público a formatação e o conteúdo do espetáculo. Na primeira etapa, o projeto visitará Brasília, Recife e Rio de Janeiro com shows abertos ao público e a projetos sociais. A segunda etapa consiste no lançamento de um CD e DVD de mesmo nome com previsão de lançamento para março de 2015, seguido da turnê nacional de 15 shows. A estreia será hoje à noite e amanhã, quinta-feira (dias 29 e 30 de outubro de 2014), no Teatro Oi, em Brasília, com ingressos a preços populares.
Antenada e plugada às novas tecnologias e ferramentas de comunicação e informação, a equipe de produção do Pelo Brasil desenvolveu uma interface virtual e interativa, onde o usuário poderá, além de baixar na íntegra e de graça conteúdos relativos ao projeto, acompanhar a turnê de toda equipe.
Com direção geral de Marcos Portinari, design de luz de Marina Stoll e imagens do VJ Boca, Pelo Brasil é um espetáculo interativo que mistura música, textos e projeções, possibilitando ao espectador uma experiência íntima e singular, como no momento em que Hamilton toca com sua própria imagem quando criança. Outro ponto alto do espetáculo é a ‘criação’, uma espécie de mergulho ao interior da alma, de uma música feita ao vivo, sem a busca formal da excelência ou de performances mirabolantes. A ideia é exercer a criatividade e a interação do músico com o momento presente e a plateia, percorrendo juntos caminhos antes desconhecidos.
Uma escola musical dentro de casa
Hamilton é carioca criado em Brasília e de família pernambucana. Quando tinha 11 meses de vida, seus pais se mudaram para Brasília levando o pequeno menino, que anos depois revelar-se-ia um dos maiores bandolinistas que o Brasil e o mundo já conheceram.
Seu pai, Seu Américo, pernambucano, contador por profissão e violonista de grande sensibilidade, foi quem apresentou a música aos filhos. Apaixonado por música brasileira, incentivou desde cedo os irmãos Hamilton de Holanda e Fernando César a terem muito bom gosto musical, colocando sambas, serestas, boleros e choros para os meninos escutarem e tirarem no instrumento, de ouvido.
Segundo Hamilton de Holanda, suas memórias desde a mais tenra infância tem muita relação íntima com a música. Ele conta, que a mudança de sua família do Rio de Janeiro para Brasília, em 1977, fez com que a relação de seu pai com o choro se aprofundasse, e isso foi nitidamente levado para o dia-dia da casa, onde não paravam de tocar na vitrola discos com os maiores chorões brasileiros de todos os tempos, o que garantia um aprendizado musical perfeito para ele e seu irmão, que cresceram num ambiente profundamente musical onde, aos poucos, iam-se acostumando a ‘tirar’ de ouvido tudo aquilo que ouviam dos mestres Jacob do Bandolim, Déo Rian, Joel Nascimento, Ernesto Nazareth e tantos outros chorões…
Com o pai Américo, o irmão Fernando César e outros músicos brasilienses, Hamilton formou seu primeiro grupo; o Dois de Ouro, com o qual gravou seus três primeiros discos.
– Meu pai é violonista e nos ensinava, a mim e ao meu irmão, Fernando César, choros. Colocava discos dos mestres Pixinguinha, Jacob do Bandolim, Déo Rian tocando Jacob e de muitos outros chorões para ouvirmos e tirarmos as músicas. Na verdade, teve coisas antes disso, tem gravações da gente cantando samba naquele clima gostoso, familiar. Então, antes de tocar eu já gostava de cantar umas coisinhas também. Meu primeiro instrumento foi a voz, foi como eu comecei a me expressar primeiramente. Mas o primeiro instrumento que eu toquei foi uma cornetinha daquelas de brinquedo, de plástico, da Hering, com uma escalinha só, colorida.
Depois fui para a escaleta e daí o para o bandolim. Meu primeiro bandolim, eu ganhei no Natal de 1981, aos cinco anos de idade – conta Hamilton de Holanda.
Tendo adotado o bandolim de 10 cordas como instrumento de trabalho, Hamilton tem intimidade com outros instrumentos. Toca violão, violão tenor, cavaquinho, baixo, e , como ele mesmo diz: “um pouco de percussão”.
– Estudei violino, mas hoje em dia não toco mais; é um instrumento muito diferente – diz o instrumentista, chamado pela imprensa internacional de ‘Jimmy Hendrix do bandolim’.
Com seis anos de idade, Hamilton entrou para a Escola de Música de Brasília e, além disso, passou a ter aulas particulares com o professor de violão Heveraldo Pinheiro; ele com seu bandolim e o professor com violão.
– Ele me ensinava partituras, músicas diferentes que não eram bandolinísticas, ensinava sobre acordes e intervalos e, enquanto isso, eu estudava violino na Escola de Música de Brasília. Tive vários professores lá: Marena, Ludimila… Depois estudei violão com o professor Paulo André Tavares… Tive a sorte de ter ótimos professores! – lembra o bandolinista, que hoje desenvolve seu próprio método de estudo do instrumento.
Quando começou a estudar não existia professor de bandolim em Brasília e o instrumento mais próximo dele para o estudo certamente era o violino. Hamilton percebeu essa relação de um instrumento com o outro e dedicou-se ao estudo do violino, principalmente no que diz respeito à parte técnica.
– O link que fiz entre o bandolim e o violino foi o desenvolvimento da mão esquerda, que aprendi com o violino. Ajudou-me muito e ajuda até hoje no bandolim – diz o instrumentista.
Primeiro cachê aos seis anos de idade
Tendo uma formação musical iniciada logo na infância, Hamilton de Holanda ganhou seu primeiro cachê aos seis anos de idade.
– Peguei aquele dinheirinho e fui comprar um presente para minha mãe. Isso é o que eu me lembro. Depois vieram uns shows com cachezinho e tudo, mas foi com 15 para 16 anos que comecei a entender um pouco a profissão, dando aulas de cavaquinho – relembra.
Na juventude, Hamilton de Holanda não se considerava um músico profissional, tendo feito um ano de Contabilidade influenciado pela família, uma vez que o pai era economista, o avô contador e o irmão, formado em contabilidade. Isso, unido ao seu receio de que a carreira musical não desse certo, falou mais alto. Mas, abandonando a perspectiva de ser contador, aos 19 anos Hamilton ingressou no curso de Composição, na Universidade de Brasília (UnB). Foi quando começou a ter a dimensão da profissão e de que estava surgindo ali uma carreira promissora vinculada à música.
Do Brasil para o mundo: Uma carreira premiada
Laureado em inúmeros festivais de música, choro… e premiado com bolsas de estudo e prêmios internacionais, foi em 2001 que Hamilton de Holanda teve a oportunidade que lhe renderia reconhecimento nacional e internacional. Nesse ano o bandolinista foi o grande vencedor de um dos mais importantes festivais de música instrumental do Brasil; o Prêmio Visa de Música Instrumental.
– O Prêmio Visa foi importantíssimo em minha carreira. Foi quando passei a assinar meus trabalhos como Hamilton de Holanda. O prêmio me deu grande visibilidade no Brasil inteiro – observa Hamilton, lembrando outro momento especial em sua carreira, quando participou do Festival de Choro, no Rio de Janeiro, em 1995.
– Foi importante porque consegui levar cinco músicas para a final e ganhei o prêmio de melhor intérprete. Minha música Destroçando a Macaxeira ganhou segundo lugar – conta o bandolinista, com um discreto tom de orgulho e saudosismo.
Dentre os tantos prêmios obtidos em sua carreira, destacam-se o Prêmio Icatu-Hartford de Artes, de melhor instrumentista brasileiro, que o levou para a Cité International des Arts, em Paris, durante um ano, o Prêmio da Música Brasileira, como melhor solista, com o disco Brasilianos 2, em 2009, e a indicação a 15ª edição do Grammy Latino com o álbum Caprichos, feito este ano.
Fundador e professor da Escola de Choro Raphael Rabello
Fundador da Escola de Choro Raphael Rabello, há 13 anos, Hamilton de Holanda foi coordenador e professor da mesma, mas hoje, em função da agenda e compromissos com shows e espetáculos, afastou-se um pouco da rotina da escola, que é uma referência do ensino e estudo de choro no Brasil e no mundo.
– Quero estar sempre ligado à atividade de professor, mas não posso me dedicar como antes, pois minha profissão não permite mais, contudo, há outras formas novas que venho adotando para continuar ensinando, como através das postagens de vídeos na internet, por exemplo, que faço no HH TV… Vou alimentando este lado de professor de outras maneiras, mas meu trabalho na Escola Raphael Rabello foi muito importante porque ela foi a primeira escola de choro criada no Brasil e eu fiz parte da primeira leva de professores, fui o primeiro coordenador da escola… Mas hoje em dia eu viajo tanto, que não consigo ter uma relação com uma escola que eu tenha de estar uma vez por semana lá… Mas o hábito de dar aula, de estar ali com os alunos é tão bacana e enriquecedor para ambas as partes, que eu procuro sempre uma maneira de dar aulas, dar workshops… – diz o bandolinista, criador do projeto Caprichos, com metodologia e didáticas dele – Hamilton -, para bandolim.
O duo com Marco Pereira e o ingresso definitivo no cenário da música internacional
Durante seus 17 anos de carreira, com 27 discos gravados, Hamilton de Holanda desenvolveu diversas formações musicais com os mais diversos instrumentistas, tendo formado duos, trios, quartetos, quintetos. Dessa trajetória, o trabalho Luz das Cordas, duo com o violonista Marco Pereira é referência pela sonoridade e a qualidade do registro. Para Hamilton este foi um momento especial.
– O Luz das Cordas foi um encontro muito feliz com o Marco Pereira, que eu já conhecia desde muito pequenininho, lá de Brasília. Ele morou em Brasília, foi professor da Universidade de Brasília. Era um cara por quem eu já tinha grande admiração, e passamos a tocar juntos. Foi um momento muito especial. Realmente esse disco me traz boas recordações. A gente fez com cuidado, com carinho… Teve um repertório muito bem escolhido. Tem choro, música brasileira em geral. Os arranjos, alguns feitos pelo Marco, outros feitos por nós dois juntos. Foi um projeto que me abriu portas para trabalhos internacionais. Além de ter marcado minha carreira discográfica, esse disco marcou de maneira definitiva minha carreira internacional – revela o bandolinista.
Parceria com Yamandu Costa promete um novo CD em 2015
Ao longo de sua carreira, Hamilton já teve a oportunidade de conhecer e gravar com muitos ‘monstros’ da nova geração da música brasileira. O violonista Yamandu Costa foi um deles. Amigos dentro e fora dos palcos e estúdios, além do CD Luz da Aurora, fizeram juntos a ‘Suíte 32’, com Paulo Aragão na orquestração. A peça já foi tocada até pela Orquestra do Estado de São Paulo (OESP). Para 2015 a dupla promete registrar em disco o encontro dos dois instrumentistas.
Quinteto: Uma nova abordagem sonora
Com formação de Gabriel Grossi na gaita, Daniel Santiago ao violão, André Vasconcelos no baixo e Hamilton de Holanda no bandolim, o Hamilton de Holanda Quinteto tem sido para o bandolinista uma nova experiência sonora e um espaço para experimentações.
– Foi um encontro de amigos brasilienses no Rio de Janeiro com a participação fundamental também do Márcio Bahia, grande baterista de Niterói. A gente se encontrou aqui no Rio numa época em que eu vim morar no Rio e começamos a fazer uma espécie de baile numa casa de show no Rio e ficou bom pra caramba! Na época era quarteto, e o Gabriel Grossi fazia participações. Tanto, que o primeiro disco do Quinteto é um disco chamado Música das nuvens e do chão, que já era com aquela sonoridade – vamos dizer assim -, uma sonoridade misturada, onde tem choro, samba… tem harmonia de música mineira, tem jazz e a influência forte do Hermeto Paschoal. Acho que a estética do trabalho é essa já desde lá de trás. Depois a gente fez o Brasilianos um, dois, três, este último consolidando a estética do grupo. Ele tem uma sonoridade muito original. Gosto muito desse trabalho. Volta e meia a gente está fazendo shows por aí – diz Hamilton.
O Mundo de Pixinguinha
– Foi um espetáculo que nasceu da parceria com um grande companheiro que trabalha comigo desde 2004/ 2005, o Marcos Portinari. Ele trabalha e pensa comigo a minha carreira. O Marcos é um artista. O que ele faz em termos de concepção é arte… E O Mundo de Pixinguinha foi assim… Estávamos numa exposição sobre Pixinguinha, em Brasília, e eu tive a ideia de fazer um trabalho com o compositor, mais voltado para o choro. Foi quando o Marcos falou: – “Por que você não convida seus amigos músicos de outros países para gravar um disco com as músicas do Pixinguinha? É uma forma de ter a sua visão do Pixinguinha e uma visão estrangeira também. É uma forma de divulgar o trabalho de Pixinguinha fora do Brasil” – conta Hamilton.
E assim nasceu o projeto O Mundo de Pixinguinha. Conseguiram patrocínio da Natura, e Hamilton de Holanda viajou para a Europa, para começar a maratona de gravações com várias feras da música mundial:
– Fomos a Paris e gravamos com Richard Galeano, depois fomos a Roma, onde gravei com Stefano Bollani. Em Nova Iorque, gravei com Winton Marsalis; em Málaga, com Chucho Valdéz. No Brasil, gravei com Omar Sosa. No Rio de Janeiro, com André Mehmari, Carlos Malta e com a professora franco-brasileira Odette Ernest Dias. Ficou um disco muito especial com arranjos feitos na hora, de forma muito espontânea – comenta o instrumentista.
Caprichos
Caprichos é um projeto que dá destaque ao bandolim de 10 cordas a partir de um repertório bem musical e melodioso, com os três elementos musicais muito claros: a melodia, a harmonia e o ritmo.
– Chamei alguns amigos e gravamos 24 caprichos. Depois, precisávamos disponibilizar esse conteúdo de forma livre pela internet – conta o bandolinista.
Ano passado, Hamilton ganhou um prêmio da Fundação Nacional de Artes (Funarte) e o projeto conseguiu ter seu site desenvolvido com o conteúdo didático disponibilizado para estudantes de bandolim do mundo todo. Através da plataforma virtual, o usuário pode ouvir e fazer download gratuito das músicas e partituras disponíveis dos 24 Caprichos. Os arquivos podem ser baixados em diversos formatos e em alta definição de áudio. As partituras podem ser salvas em formato xml, arquivo aberto, que permite ao usuário editar a partitura e transpor a mesma para seu instrumento específico.
Saiba mais: {http://hamiltondeholanda.com/caprichos/}
Bossa Negra
Em 2009, durante uma participação especial do sambista Diogo Nogueira num show de Hamilton de Holanda em Miami, surgiu a ideia de fazerem um projeto juntos.
– Veio a ideia de fazer uma coisa ligada aos Afro-sambas, do Baden Powell e Vinícius de Moraes, porque a gente sempre tocava e relembrava esses sambas. E ano passado o projeto aconteceu. Fiquei muito contente com o resultado do Bossa Negra porque ele tem um equilíbrio muito bacana entre a parte instrumental e a parte da poesia, a parte cantada. O canto está num lugar muito bonito do disco, mas o bandolim também está, a percussão do Tiago da Serrinha e o baixo do André Vasconcelos também ficam num lugar muito bonito. As canções são claras com o que a gente queria dizer. É um trabalho muito interessante e que deve rodar muito ainda por aí – conta Hamilton de Holanda.
O Trio
– A formação do trio é uma formação onde o bandolim de 10 cordas como instrumento aparece de maneira mais esplendorosa, vamos dizer assim, principalmente, porque a responsabilidade em um trio é diferente, pois como só estamos eu e o André fazendo a harmonia, o bandolim precisa desenvolver um tipo de linguagem para que fique claro para quem está ouvindo, que a soma dele com o baixo dá o ambiente harmônico que a música precisa. E, além do harmônico, tem a coisa rítmica, que junto com a percussão e o bandolim é explorada ao máximo nessa formação. É uma formação que eu gosto muito. Tem sido minha formação ‘arroz com feijão’. É a formação com a qual eu viajo mais e é a base também do trabalho Bossa Negra. É uma formação que me dá uma liberdade estética, onde eu posso misturar músicas de diversos compositores e criar uma unidade com essa formação. É uma formação muito boa. Gosto demais dessa formação! – diz Hamilton.
Baile do Almeidinha
O Baile do Almeidinha é um sucesso! Começou há dois anos, na Lapa, Rio de Janeiro, e, desde então é um fervor entre os jovens cariocas. Quem anima o salão é Hamilton de Holanda com seu bandolim. Mesmo fora de temporada de festas de Momo, o baile acontece, consolidando a intensa relação dos cariocas com as gafieiras de salão e o Carnaval… É programa marcado na agenda de muita gente!
– É um baile tipo gafieira, que eu faço uma vez por mês no Circo Voador, com música para as pessoas dançarem. O projeto é um sucesso e, provavelmente, vou começar a viajar com o Baile do Almeidinha em 2015. É uma novidade para mim e tenho gostado muito – comenta Hamilton, destacando o fato de tocar para as pessoas dançarem, algo incomum na carreira de um instrumentista.
Dicas de estudo e equipamentos Por Hamilton de Holanda
Revista do Choro: Como é sua rotina de estudos? Como costuma aquecer os dedos?
Hamilton de Holanda: Minha rotina de estudos acontece em função do que está acontecendo no meu dia-dia. Se estou viajando, estudo no hotel. Se estou em casa com meus filhos e estou tocando com eles, esse momento é um momento de estudo. Mesmo quando estou sem o bandolim e quero lembrar de alguma música, estou estudando também. No palco, se faz tempo que não toco uma música e ali é um momento de ‘download’ daquelas notas todas que estão no meu HD, na minha mente, isso é uma maneira de estudo para mim… Então, a minha rotina é essa: tocar o máximo de tempo possível que eu conseguir durante o dia.
Para aquecer os dedos, aí depende: tem dias que eu improviso, tem dias que pego uma música conhecida e fico tocando, tem dias que pego os Caprichos. Se eu tomar três doses de Capricho por dia já estou estudado.
Revista do Choro: Qual(is) corda(s) você usa?
Hamilton de Holanda: Uso cordas Elixir. Uma corda americana muito boa. Uso a corda 5 para o par Dó, para o bandolim de 10 cordas.
Revista do Choro: Quais instrumentos você tem usado ultimamente?
Hamilton de Holanda: Eu uso o bandolim do Tércio Ribeiro, que é um luthier aqui do Rio de Janeiro e um violão tenor do Lineu Bravo. São esses instrumentos que eu tenho usado.
Revista do Choro: Como é sua relação com os luthiers?
Hamilton de Holanda: A relação com o luthier é quase um namoro. É uma relação muito bacana porque ele dedica o tempo dele, o coração, a inteligência para fazer seu instrumento e aquilo serve como meu instrumento de arte, minha maneira de me expressar artisticamente. Então, tem muito sentimento envolvido, mas ao mesmo tempo tem uma coisa técnica de ter a melhor madeira, o melhor traste, de ter os leques internos e travessas também feitos da melhor maneira possível. Tem essas duas coisas. Tem a busca técnica, mas o resultado tem que emocionar. É uma relação que a gente acaba desenvolvendo de muita cumplicidade e carinho com o luthier.
Revista do Choro: Qual dica você dá para quem está começando a estudar bandolim?
Hamilton de Holanda: Para quem está começando a estudar bandolim e quer se desenvolver dentro da escola brasileira, o primeiro de tudo é escutar o mestre Jacob do Bandolim o máximo possível. Quanto mais, melhor. E daí, partir para os outros: Luperce Miranda, Joel Nascimento, Armandinho Macedo, Ronaldo do Bandolim. Esses são alguns dos pilares da escola brasileira de bandolim. Escutar e tentar tirar as frases enquanto você não encontra a sua própria linguagem não é mau nenhum. Tirar as frases iguais as do Jacob, tirar frases iguais as do Armandinho… não é ruim. São mestres que já passaram pela provação, vamos dizer assim, de encontrar a própria linguagem. E a gente aprende muito com isso… vê como a mente deles funciona no braço do instrumento. É importante ter muito cuidado com duas coisas: uma é com a afinação; o bandolim é um instrumento que exige um pouco mais de paciência. E outra é o timbre, a sonoridade. Como encontrar a sonoridade, a sua, única, sem ser aquela coisa mastigada demais, aquele som do bandolim agressivo e agudo demais? O bandolim já tem um agudo natural, ou seja, se forçarmos mais, o timbre fica ácido demais. Então, eu diria para o estudante cuidar muito da afinação, cuidar muito do timbre, do tipo de sonoridade. E daí estudar muito, meu amigo! Estudar muita música, estudar harmonia, ouvir muitos tipos de música, música erudita, jazz, flamenco, Piazzola, ouvir de tudo, porque assim é possível encontrar sua própria linguagem.
Revista do Choro: E qual dica você dá a quem está começando a tocar ou a quer tocar choro?
Hamilton de Holanda: Quem quer tocar choro tem que conhecer a linguagem do choro. Então, é mais ou menos o que eu falei para quem quer tocar bandolim. Tem que ouvir os discos de choro, tem que estudar, tem que tirar, tem que comprar partituras de choro, tem que encontrar com outras pessoas que gostam de choro para compartilhar, porque o choro, na verdade, além de ser uma musica, é um momento de encontro. Antigamente, dizia-se “vamos lá no choro do Pixinguinha!”, como hoje se fala “vamos no pagode do fulano”. O choro tem essa coisa do encontro, não adianta estudar sozinho… No choro tem que arrumar parceria, criar um grupo, um duo, um trio… seja lá o que for. Tem que estar convivendo com as pessoas, porque aí sim a música se eleva, as pessoas se elevam, e vem o coração só para curtir a beleza do chorinho brasileiro.
[Foto de Marcos Portinari]