Donga: um dos violonistas dos Oito Batutas


Leonor Bianchi

Exposição virtual que estou publicando este ano na Revista do Choro para lembrar o centenário de formação dos Oito Batutas destaca hoje a figura de Donga.

 

Donga sendo apresentado ao maestro inglês Leopold Stokowski pelo nosso grande chorão Villa-Lobos, em 1940.

Donga sendo apresentado ao maestro inglês Leopold Stokowski pelo nosso grande chorão Villa-Lobos, em 1940.

Ernesto Joaquim Maria dos Santos, o Donga, nasceu no Rio de Janeiro, em 1890 onde faleceu em 1974. Mas há controvérsias quanto a data de nascimento do compositor: ela está entre os anos de 1889, 1890 e 1891 e os meses de abril e maio.

Compositor, instrumentista (violão e cavaquinho) foi um dos primeiros músicos negros brasileiros a receber reconhecimento aqui e internacionalmente.

Seus pais foram o pedreiro Pedro Joaquim Maria dos Santos e Amélia Silva dos Santos.

Sua mãe, chamada de Tia Amélia, é uma das figuras-chave do grupo das “baianas do bairro da Cidade Nova”, do qual também faz parte Tia Ciata. Além da organização de festas, rodas de música, cultos religiosos afro-brasileiros, ela colabora na fundação de blocos e ranchos carnavalescos, dos quais Donga participa ainda menino.

Donga aprendeu a tocar cavaquinho e violão na infância e compões suas primeiras canções na adolescência. É com o grupo de jovens músicos que frequentam a casa das tias baianas na Cidade Nova e Saúde que inicia a vida artística.

Entre 1913 e 1914, com o pseudônimo Zé Vicente, se junta aos amigos Pixinguinha e Caninha para compor o Grupo do Caxangá, liderado por João Pernambuco, que se dedica aos temas nordestinos, como é moda na época. Cerca de dois anos mais tarde, após reunião festiva na casa de Tia Ciata, compõe Pelo Telefone, com Mauro de Almeida, canção baseada nas várias referências musicais presentes nos encontros. Sucesso no Carnaval de 1917.

Na década de 1920, Donga iniciou uma vida profissional intensa, participando de diversos conjuntos.

Em 1919, como violonista, passou a fazer parte do grupo Os Oito Batutas, liderado por Pixinguinha, e que começou tocando no saguão do Cinema Palais, na Cinelândia.

No primeiro semestre de 1922, patrocinados por Arnaldo Guinle, viajou com o grupo Os Oito Batutas para com o então ‘Les Batutas’ no Dancing Sherazade, em Paris. A temporada obteve sucesso, mas o grupo se separou logo em seguida.

Na volta da França, Os Oito Batutas foram para a Argentina fazer uma temporada em Buenos Aires, onde um disco gravaram pela RCA Victor.

Em 1926, Donga participou do grupo Carlito Jazz para acompanhar a campanha de revistas Batachan (França) e com ele volto à Europa para uma turnê.

Cria, em 1928, a Orquestra Típica Pixinguinha−Donga, seguindo vários intérpretes e gravando com eles.

Nos anos1930 os dois músicos e amigos fundam os grupos Diabos do Céu e Guarda Velha. Eles se apresentam em diversas emissoras de rádio e acompanham inúmeros intérpretes em gravações.

Em 1932, Donga se casa com a cantora Zaíra de Oliveira, com quem tem a única filha, Lígia. Sua esposa falece em 1951 e dois anos depois se casa com Maria das Dores dos Santos.

Em 1940 é convidado por Heitor Villa-Lobos para participar, com João da Baiana e Pixinguinha, de um encontro com o maestro inglês radicado nos Estados Unidos Leopold Stokowski (1882 – 1976). As gravações no navio Uruguai, ancorado no Rio de Janeiro, redundam no disco Native Brazilian Music. Das 16 músicas selecionadas para o disco, nove têm assinatura de Donga, entre elas a embolada Bambo do Bambu (com Patrício Teixeira), interpretada pela dupla Jararaca e Ratinho. Essa canção é posteriormente gravada por Carmen Miranda nos Estados Unidos, em 1939, e por Ney Matogrosso, no LP Pois É, em 1983. Por iniciativa do radialista Almirante, Donga formou com Pixinguinha, em 1954, o conjunto Velha Guarda, cujo objetivo era retomar a obra e a vida artística dos músicos mais antigos. O grupo tocou no programa do Almirante, Pessoal da Velha Guarda, até 1958, além de se apresentar em diversos espetáculos, como o Festival da Velha Guarda, em São Paulo (1954/1955).

Donga foi um dos primeiros artistas a gravar um depoimento sonoro para o Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro (MIS/RJ), em 1969. Paralela à vida artística, foi oficial de justiça, função na qual se aposentou.

Comentário Crítico

Donga cresce em um ambiente musical ainda repleto de referências culturais do século XIX e de origem rural, mas que já comporta novos elementos do cenário urbano carioca. É principalmente na casa da Tia Ciata que ele convive com os aspectos das culturas afro-americanas e rurais que ainda persistem de modo transformado nas primeiras décadas do século XX e se revelam em algumas de suas composições. Essas características podem ser identificadas no jongo Sai, Exu (1922), parceria com China, no ponto de macumba Que Querê (1932), com João da Baiana e Pixinguinha, e em Macumba de Oxóssi (1940) e Macumba de Iansã (1940), com Espinguela. Além das composições de feições religiosas, ele deixa registrados sambas de partido alto como Há! Hu! Lá! Ho! (1931), com João da Baiana e Pixinguinha; batucadas Vi o Pombo Geme (1932) e Conversa de Crioulo (1932), com João da Baiana e Pixinguinha, e Casca de Banana (1946), com Jararaca; e a chula raiada Patrão, Prenda Seu Gado (1931), em parceria com João da Baiana e Pixinguinha, ambas lançadas nas duas faces do mesmo disco pelo Grupo Guarda Velha.

 

Fonte (texto adaptado)

DONGA . In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2019. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa558640/donga>.

ISBN: 978-85-7979-060-7

© 2019 Itaú Cultural

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Author: imprensabr