Depois de uma tendinite, Daniel Velloso Rocho desenvolveu uma técnica para não deixar de tocar e trabalhar
Leonor Bianchi
Baiano, Daniel Velloso Rocho (toca violão desde os 14 anos. Estudou violão clássico na UFBa e após ‘conhecer Raphael Rabello’, ‘converteu-se’ ao choro e ao violão de sete cordas, segundo ele mesmo nos conta. Aluno dos mestres Gilson Verde e Zé Barbeiro, atualmente toca na banda de Armandinho Macedo e no grupo de choro ‘Patuscada’.
Há aproximadamente um ano, Daniel vem notando uma ‘certa’ desobediência do polegar em retornar para a posição de repouso, como se o dedo tendesse a se esconder dentro da mão. Após exames, confirmou-se uma inflamação no tendão. E como a recuperação leva tempo, o violonista começou a estudar uma forma de não deixar de tocar.
“Neste período, para não ficar sem tocar fui, clandestinamente (rss) substituindo o polegar pela palheta e incluindo o dedo mindinho para tocar o ritmo. Clandestinamente eu digo, pois, pela força que a tradição tem no meio do choro, sei que mudanças drásticas como esta chocam e não são bem recebidas de primeira, no entanto uma vez que a recuperação não chegava não me restava alternativa senão me adaptar e tocar a carreira pra frente”, conta Rocho.
Palheta X dedeira
Guitarrista por muito tempo, Daniel domina a manipulação da palheta, e por ser formado em violão clássico, sabe como deve soar o instrumento. Partindo destes princípios, ele procura tocar de uma maneira que o som da palheta seja quase idêntico ao da dedeira.
“Por ter sido guitarrista por tantos anos sei como usar uma palheta, e por ser formado em violão sei como deve soar um violão, então busco tocar com a palheta de uma forma que não se perceba a diferença entre ela e a dedeira”, diz Daniel.
Ele conta que ‘escolheu’ a palheta à dedeira porque com esta última ele precisaria usar o dedo polegar e isso exigiria movimento da articulação – o que ele não tem mais; perdeu com a tendinite. Com a palheta ele consegue tocar usando o movimento do punho.
A técnica em si
Segundo Daniel, o criador da técnica “a palhetada deve ser sempre para baixo, apoiada na corda inferior assim como faz a dedeira, e o movimento trazido pelo antebraço e punho, similar a técnica do violão cigano manouche”.
Vídeo aulas “Violão 7 Cordas de Palheta”
“Assim nasceu a ideia das vídeo aulas “Violão 7 Cordas de Palheta”, onde um não-violonista e um violonista podem se ater ao estudo dos fraseados e levadas rítmicas, pois estão completamente dentro do estilo, não fugindo à tradição e trazendo o que há de contemporâneo neste instrumento”.
Roberto Leon Grela, um violonista argentino, nascido em Buenos Aires em 1913 e falecido aos 79 anos, em 1992, foi um famoso compositor de tango e grande apreciador da música popular brasileira. Grela não tocava violão de sete cordas, tocava de seis. No início de sua carreira musical ele tocava bandolim, mas foi com o violão que fez longa e profícua trajetória, entrando para o rol dos maiores músicos do país e um dos maiores instrumentistas de tango. À prática do seu violão de seis cordas Grela fazia uso da palheta. O que na época não ‘pegou’ aqui no Brasil entre os músicos.
Quanto ao criador do método do uso de palheta no sete cordas, ele nos conta que ao descobrir a estória de Grela contada pelo amigo e virtuoso violonista Yamandu Costa, sentiu-se mais ‘aliviado’:
“Uma coisa que me confortou foi o Yamandu Costa me falar que o Raphael Rabello do tango, onde se usa a técnica clássica de violão de nylon, era o Roberto Grela, que também usava palheta”.
O que dizem os tradicionalistas
“Em minha trajetória conheci muitas pessoas apaixonadas pela linguagem do 7 cordas, mas que vinham de outros estilos e, às vezes, não tinham uma técnica violonística e acabavam tocando o 7 cordas como podiam e até de palheta. Com isso percebi que esta minha adaptação poderia ser útil para estes com relação à mão direita e, em termos de linguagem do estilo, interessante a todos.
Palheta no violão: Uma prática não muito aceita no Brasil
Segundo Daniel, aqui no Brasil não se dá muito valor a quem toca violão (tanto o de seis, quanto o de sete cordas) de palheta por dois motivos: questão de timbre, que sai diferente; e velocidade da manipulação das cordas, que fica mais rápida com a palheta do que apenas com os dedos.
Como explica o instrumentista, essa rapidez e agilidade proporcionadas pela palheta são vistas como uma trapaceada do músico ao instrumento e isso seria o maior motivo pelo qual existe um enorme preconceito entre os tradicionalistas da escola do violão brasileiro ao uso ou ao estudo e aprofundamento da prática da palheta no violão, tanto de seis quanto de sete cordas.
“O que eu busco é justamente esta ‘honestidade’, fazendo frases numa velocidade que uma dedeira alcançaria, dando o timbre que a dedeira alcançaria…”, conclui Daniel.