MinC e Funarte anunciam realização de nova edição do ‘Projeto Pixinguinha’


Leonor Bianchi

Um dos projetos de maior expressão já realizados pelo Ministério da Cultura do Brasil sem sombra de dúvidas foi o Projeto Pixinguinha. Tenho amigos que atuaram na idealização do mesmo e lutaram para sua existência e sobrevivência, e depois de extinto, por seu retorno. Vimos duas fases do projeto desde a primeira no final dos anos 70 idealizada pelo produtor musical Hermínio Bello de Carvalho, e outra depois nos primeiros anos da última década. Segundo Hermínio, o projeto nasceu do ‘Seis e Meia’, um projeto anterior que também fez muito sucesso no Rio de Janeiro revelando novos nomes da música popular. Amigo do diretor musical do Teatro João Caetano, Hermínio foi convidado para fazer o Seis e meia, que viraria depois o Projeto Pixinguinha.

Centenas de excelentes instrumentistas brasileiros em palcos de cinco regiões do Brasil apresentando a melhor música do mundo para o público que menos conhecia sua própria música; o brasileiro. Além de um projeto de cultura e entretenimento, era uma aula de história do Brasil; um projeto de educação.

Proposto pela Sociedade Musical Brasileira (a Sombras) e realizado pela Funarte, o Projeto Pixinguinha foi criado em 1977, com o objetivo de difundir pelo país apresentações de música brasileira a preços acessíveis. No palco, a marca do projeto era promover um encontro musical entre dois ou mais artistas – muitas vezes pertencentes a gerações, estilos musicais ou procedências diferentes. Entre os shows memoráveis da história do Projeto estão as duplas Cartola e João Nogueira, Nara Leão e Dominguinhos, Moreira da Silva e Jards Macalé, Marlene e Gonzaguinha, entre outras.

Cartola e João Nogueira juntos no palco do Projeto Pixinguinha (1977). Acervo Funarte.

Cartola e João Nogueira juntos no palco do Projeto Pixinguinha (1977). Acervo Funarte.

O projeto foi tão importante dentro do espectro das ações desenvolvidas pelo órgão responsável pela gestão cultural do país na última década da Ditadura Militar, que deixou marcas extremamente positivas no que tange a essa – digamos assim -, disseminação da cultura nacional para ‘o povo brasileiro’ ver e conhecer num período em que falar sobre a nossa história era crime. No final dos anos de 1970 o mundo todo já conhecia a música brasileira e a flauta do maestro Pixinguinha, contudo o próprio brasileiro não. A proposta de criar uma ‘caravana musical’ levando a música feita no Brasil para o brasileiro foi sim uma ação tão mais educativa do que cultural e também possibilitou a divulgação de nomes importantes da música popular brasileira contemporânea em território nacional.

MinC vai fazer nova edição do Projeto Pixinguinha

Na segunda quinzena de março deste ano, o Ministério da Cultura (MinC) anunciou a criação uma comissão que ficará responsável pela elaboração de um edital para realizar uma nova edição do Projeto Pixinguinha. Ainda não foram divulgadas datas, mas num momento em que o país passa por uma enorme crise econômica e política, a notícia de que um dos maiores projetos de difusão musical já promovidos pelo órgão federal de gestão da Cultura vai retornar é um acalanto e a esperança de que através da música e da arte o povo brasileiro possa despertar sua consciência (política). 

Filme traz depoimentos de quem criou e tocou no projeto

Projeto Pixinguinha é um videodocumentário que relembra uma das iniciativas mais bem-sucedidas da música popular brasileira no fim dos anos 1970. Através de fotografias, arquivos de áudio e outros itens do acervo da Funarte, a história da criação e dos primeiros anos do Projeto Pixinguinha é o tema desta produção de 56 minutos.

Hermínio Bello de Carvalho durante as gravações do documentário

Hermínio Bello de Carvalho durante as gravações do documentário

O videodocumentário é parte do Brasil Memória das Artes – projeto de preservação e difusão do acervo do Cedoc/ Funarte, realizado pelo Centro de Programas Integrados da Funarte, com patrocínio da Petrobras, através da Lei Federal de Incentivo à Cultura.

Juntamente com o acervo da Funarte, Projeto Pixinguinha traz depoimentos exclusivos do poeta e produtor Hermínio Bello de Carvalho – um dos idealizadores da iniciativa, criada a partir do projeto Seis e Meia – e de três participantes das turnês do Projeto: a cantora Doris Monteiro e os compositores e instrumentistas Alceu Valença e João Bosco, que relembram os espetáculos que dividiram com artistas como Lúcio Alves, Jackson do Pandeiro e Clementina de Jesus.

O videodocumentário traz ainda trechos da série de programas Pixinguinha 10 anos, produzida em 1987 pela Funarte, numa parceria com a TV Educativa, que a exibiu na ocasião. Nesses trechos, vemos em ação outros grandes nomes que fizeram a história do Projeto Pixinguinha, como Elizeth Cardoso, João do Vale, Marlene, Nelson Cavaquinho, Carmélia Alves, Johnny Alf, Dona Ivone Lara e Zélia Duncan, entre outros nomes do primeiro time da música popular brasileira.

Publictária baiana escreveu dissertação sobre os 30 anos do Projeto Pixinguinha

Com o objetivo de “investigar o papel do Projeto Pixinguinha no universo das políticas públicas de incentivo, democratização e acesso aos bens culturais no país, em dois momentos históricos específicos: os anos 1970, quando foi criado, e os anos 2000, com análise específica de 2004 a 2007” nasceu a dissertação de mestrado da publicitária Gabriela Sandes. Aliado ao estudo dessa trajetória, ela colheu depoimentos de alguns dos atores sociais envolvidos na execução do Projeto de 2004 a 2007, em especial aqueles ligados ao poder público nas esferas municipal, estadual e federal. Com a reunião desses elementos, foi traçado um panorama de atuação do Projeto Pixinguinha e sua missão de difundir a música brasileira e formar plateias.

Mestre em Bens Culturais e Projetos Sociais pela Fundação Getúlio Vargas, Gabriela escreveu a dissertação de Mestrado intitulada Projeto Pixinguinha 30 Anos de Música e Estrada. 

Lançado pela Funarte durante a ditadura militar, o projeto tinha o objetivo de difundir música brasileira pelas cinco regiões do país e formar plateia. “Um dos maiores desafios foi compreender o papel do Projeto Pixinguinha dentro de uma política de democratização e de acesso à produção cultural, a partir do testemunho de determinados atores sociais a ele relacionados”, explica Gabriela.

“Trabalhando na gerência de patrocínios da Petrobras, maior apoiadora do projeto, Gabriela acompanhou diversas caravanas e pode ver de perto o impacto causado por elas nas cidades incluídas nas programações ─ entre 2004 e 2007. “Fui entendendo aos poucos a importância desta iniciativa na história da MPB. Fiquei interessada em compreender o que estava por trás do projeto, que permitia a sua realização, com a preocupação de ir além da fala oficial da Funarte”, conta Gabriela.

A publicitária Gabriela Sandes acompanhou caravanas para elaborar sua dissertação de Mestrado sobre o Projeto Pixinguinha. Crédito: Luciana Avellar.

A publicitária Gabriela Sandes acompanhou caravanas para elaborar sua dissertação de Mestrado sobre o Projeto Pixinguinha. Crédito: Luciana Avellar.

Em sua pesquisa, a publicitária constata que as parcerias firmadas pelo poder federal com as secretarias de cultura municipais e estaduais viabilizaram o exercício do chamado Sistema Nacional de Cultura, uma das principais prerrogativas da política cultural na gestão do ex-ministro Gilberto Gil. “Na prática, esse sistema consiste em executar ações de cultura a partir da divisão das responsabilidades e dos custos entre as três esferas de poder”, explica. Nessa negociação de contrapartidas, fundamental para tirar o projeto do papel, coube à Funarte cuidar das passagens aéreas e dos cachês dos artistas, por exemplo. Enquanto que o poder local se responsabilizava em fornecer apoio logístico ─ como garantir a alimentação e a hospedagem de toda a equipe envolvida.

Gabriela também analisou a distribuição por estado das atrações escolhidas para as caravanas em 2004. De acordo com ela, houve um equilíbrio relativo na seleção dos artistas regionais ─ feita a partir das indicações das secretarias estaduais e municipais de cultura. Dos 44 nomes classificados nesta categoria no ano da retomada, 7 vinham da Região Sul, 8 do Sudeste e 7 do Centro Oeste e 9 da Região Norte. O Nordeste, que possui um número maior de estados, foi representado por 13 atrações locais. Já a triagem nacional, que definiu 87 atrações via edital público, privilegiou a Região Sudeste. “Setenta e nove por cento dos artistas contemplados vinham de Minas, São Paulo, do Rio ou do Espírito Santo”, afirma Gabriela.

Leia a Dissertação de Mestrado de Gabriela Sandes.

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Author: imprensabr