Por Leonor Bianchi
O clássico livro de Alexandre Gonçalves Pinto, conhecido como Animal, ‘O Choro: reminiscências dos chorões antigos’, publicado em uma edição alternativa, em 1936, com poucos exemplares, por um trabalhador dos Correios (RJ), semi-alfabetizado, é objeto de estudos e fonte para pesquisas sobre a música popular brasileira, sobretudo, o choro, até os dias de hoje. O livro é considerado o primeiro texto sobre o gênero e, de certa forma, o primeiro texto etnográfico e biográfico sobre personagens do choro; neste caso, especificamente, os chorões mais populares do Rio de Janeiro, que tocavam no final do século XIX.
Em um dos verbetes do livro, onde apresenta 280 chorões, o autor, o Animal, fala do Raymundo Conceição, um mulato que morava na Rua de Santana, no bairro Cidade Nova, ao lado de onde ficava a Pequena África, reduto dos músicos mais virtuosos desse tempo, da família de Pixinguinha e de tantos outros que vieram a se tornar nomes-referências para o choro.
Raymundo recebia em seu quarto, nesse apartamento na Rua de Santana, dezenas de chorões que faziam dali suas casas. E, anos depois, no século XX – outro Raimundo (de Brito), um jornalista do Senado, da recém-inaugurada Brasília, também fazia o mesmo: recebia em seu apartamento, no bloco C da Superquadra Sul, uma das primeiras residenciais da nova capital federal, inaugurada em 1960, o primeiro núcleo de chorões da Brasília, frequentado inclusive por Jacob do Bandolim.
Décadas de distância entre ambas as circunstâncias, quem observou a coincidência foi a pesquisadora da Música Popular Brasileira, Beth Ernest Dias. Escrevendo sobre a presença do Citarista Heitor Avena de Castro na então nova capital do Brasil, em meados da década de 1960, ela ‘linkou’ os fatos e justapôs a crônica de Alexandre Gonçalves Pinto ‘O quarto do Raymundo’ publicada no livro O Choro a uma que ela mesma escreveu para seu livro Avena de Castro: a cítara e o choro em Brasília (2016):