ALINE MORENA, HERMETO PASCOAL E A POIESIS EM HARMONIA


EX PARCEIRA E COMPANHEIRA DE HERMETO PASCOAL, ALINE MORENA FALA À REVISTA DO CHORO SOBRE SUA HISTÓRIA COM O MÚSICO

Leonor Bianchi

Esta semana a Revista do Choro inicia uma homenagem ao músico Hermeto Pascoal, que fez sua passagem no último dia 13 de setembro deixando um legado gigantesco para a humanidade com sua contribuição artístico-musical.

Em 2015, com a Revista do Choro ainda muito criança, fazendo um ano de vida, tive a oportunidade de entrevistar Hermeto Pascoal. A entrevista foi através de uma live feita de Lumiar, Rio de Janeiro – São Paulo, onde ele residia, na época.  Participou da entrevista também seu filho Fábio Paschoal com quem conversei rapidamente por mensagem, recentemente, e confirmou sua participação na homenagem, pedindo apenas que eu aguardasse um pouco, pois ele está com inúmeras atividades, viajando a trabalho, inclusive para receber menções honrosas e prêmios em memória ao seu pai, que estão sendo concedidas por diversas entidades de diferentes estados do Brasil.

A partir desta semana publicarei na Revista do Choro a série Viva Hermeto Pascoal, com entrevistas em vídeo e em texto concedidas por músicos que trabalharam com ele, amigos próximos, familiares e também sua ex companheira; a cantora e compositora Aline Morena, que teve uma relação amorosa com Hermeto Pascoal com quem também compartilhou o palco e diversas produções musicais e artísticas.

Participe desta homenagem aqui na Revista do Choro e no canal novo da Revista do Choro no YouTube. Nosso canal antigo foi derrubado em setembro e estou começando do zero um novo canal na plataforma, que se demonstrou, infelizmente, muito sensível. A nova política do YouTube prejudicou milhares de canais e o da Revista do Choro foi um deles. Neste sentido, peço a você que se inscreva neste novo canal da Revista do Choro, comente e compartilhe os vídeos para levarmos esse conteúdo relevante para um número maior de pessoas que ainda precisam conhecer o choro, a cultura brasileira e o seu próprio patrimônio cultural.

Hermeto Pascoal também é patrimônio cultural do Brasil, e merece todo o nosso amor, respeito e homenagens.

Tendo como intermediadora desta homenagem a Revista do Choro, espero contribuir para a preservação da obra deste gênio da nossa música, que foi Hermeto Pascoal.

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Vinheta da série faz menção ao livro calendário do som

Para levar a série Viva Hermeto ao ar, criei uma vinheta para a abertura dos vídeos onde os entrevistados aparecem falando sobre Hermeto Pascoal, inspirada no seu livro Calendário do Som. Inicialmente pensei numa vinheta extremamente poética, lenta, com um piano ao fundo, ou um clarinete… mas o vigor da música do Hermeto fez pulsar forte o sangue nas veias e bateu como um triângulo e uma zabumba em meu coração, e me veio à cabeça a imagem de um picadeiro de circo, uma criança soltando pipa, um cachorro mergulhando num lago, um pássaro voando no céu, e senti que a vinheta tinha que trazer vida, cor, luz e som. Foi nesse momento que a imagem da arte da capa do livro Calendário do Som, de autoria do próprio Hermeto Pascoal surgiu na mente dando inspiração para criação da vinheta da série, como vocês podem ver no short abaixo.

LEIA A SEGUIR A ENTREVISTA

Aline Morena 13 anos de convivência e de relacionamento com Hermeto Pascoal, os projetos que desenvolveram juntos, e o amor que Hermeto transmitiu a ela e deixou em sua vida. Daqui a pouco no site da Revista do Choro. A entrevista também foi realizada em vídeo e será publicada no canal da Revista do Choro no YouTube. Inscreva-se no canal clicando aqui.

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1. Revista do Choro: Quem é Aline Morena? Fale um pouco sobre quem é você, onde você nasceu, onde cresceu, onde você estudou, como foi sua formação artística e musical, e como você começou a dar aulas de canto.

Aline Morena: A partir da música “Rosa Morena” de Dorival Caymmi, intitulei-me “Aline Morena”. Sou Aline Paula Nilson, gaúcha de Erechim/ RS, que viveu toda a infância em Ariquemes/RO. Comecei a cantar profissionalmente em casamentos e bodas, aos 13 anos de idade. Sou Bacharel em Canto. Cursei a Licenciatura Plena em Música. Fiz pós-graduação em Música e Cognição e em Musicoterapia. Sou professora de Canto e Musicalização desde os 20 anos de idade. Fui regente de coro infantil e infanto-juvenil. Lancei dois CDs em duo com o Hermeto, um dvd em duo também com ele e dois CDs solo, sendo o último o “Aline Morena Convida”, com arranjos próprios e 50 convidados, inclusive o Hermeto na faixa “Praia da Nina/Sinais Vitais/ Bach”. Trabalho atualmente também com crianças e adolescentes em vulnerabilidade social, dando aulas de canto e musicalização.

2. Revista do Choro: Como você conheceu a obra do Hermeto Pascoal?

Aline Morena: Conheci a obra do Hermeto, inicialmente pela música “Plin”, presente em um vinil na FAC, em Passo Fundo/RS, onde fiz minha graduação. Me encantei com a música e mais tarde soube pelo próprio Hermeto que essa era, inicialmente, a introdução para a música “Ovo de Codorna”, do Luiz Gonzaga. Acabou virando uma música independente. Anos depois, já residindo em Curitiba, ótimos músicos daqui tocavam, na Feirinha do Largo, todos os domingos, a música do Hermeto, em uma livraria, e eu ficava só escutando, encantada sobre como pessoas que nem se conheciam, mediante aquele som, começavam a conversar entre si…que som era aquele, capaz de transformar tanto o ambiente? Aí passei no Concurso “Domingo Onze e Meia”, do Conservatório de MPB de Curitiba e realizei o show “Hermeto em Voz para Dançar”! Em agosto de 2002.

3. Revista do Choro: Você lembra qual foi a sensação que você sentiu quando escutou Hermeto Pascoal pela primeira vez?

Aline Morena: Justamente pela música “Plin”, chamou-me a atenção a riqueza do arranjo, a criatividade do compositor. Ao mesmo tempo lúdica e alegre. Depois, quando conheci os demais discos, percebi que a maior parte das músicas dele não servia de plano de fundo. Quando estava limpando a casa e escutando, a música me levava a parar de limpar pra poder prestar atenção. “Montreux” soa pra mim como uma belíssima declaração de amor e “Pixitotinha” sempre me acalmou.

4. Revista do Choro: O que fez com que você quisesse conhecer pessoalmente o músico e Hermeto Pascoal?

Aline Morena: Já tinha feito um show só com músicas dele e recebi o ingresso para o seu show em Maringá dois meses depois desse show. Um dia antes ele deu um workshop na área externa da Uel, em Londrina, e ele iniciou assim: “_Quero ver quem tem coragem de ser o primeiro a subir no palco pra fazer uma pergunta ou fazer um som comigo!” Eu fui correndo, subi no palco com um cano, cantei dentro do cano a melodia que havia composto para estes versos do Carlos Fregtman: “A arte é medicina que cura as feridas…ah, que morre se está presa e não pode voar!” Em seguida pedi pra ele me acompanhar na sua “Montreux”. Fechei os olhos e cantei.

5. Revista do Choro: Quando você quis conhecer o Hermeto seu interesse era apenas na música dele ou você estava apaixonada por ele?

Aline Morena: Estava apaixonada pela música dele e nada sabia de sua vida pessoal.

6. Revista do Choro: Por falar em paixão, em amor, como foi a relação de vocês dois? Como vocês se conheceram, como ‘pintou o clima’, e como uma coisa fluiu?

Aline Morena: Lá em Maringá eu fui conhecer o Hermeto no hotel porque conhecia o produtor do show, Paulo Petrini. O Hermeto achou que eu era a jornalista que ele estava esperando pra conceder entrevista…depois me confundiu com outra cantora que tinha cantado mal no dia anterior, em Londrina. Quando finalmente percebi e me expliquei ele pegou a escaleta, fez um acorde, eu cantei uma nota e ele interrompeu dizendo: “Você topa dar uma canja no show com meu grupo hoje à noite?” Eu disse imediatamente que sim! No meio do show ele me chamou, dizendo “Vou chamar agora pra fazer um som conosco uma promissora cantora gaúcha, Aline Morena!” O grupo fez poucos acordes em ritmo de baião e eu improvisei com a voz pela primeira vez na minha vida…cantava MPB, mas era recém-formada em Canto Lírico! Eu me senti muito bem fazendo aquilo!

No hotel o Hermeto disse que tinha um irmão no Rio, o Elísio, que compunha e tocava bem violão. Eu queria formar um trabalho musical…o Hermeto disse que se eu quisesse trabalhar com o irmão dele, ele iria adorar.

No dia seguinte, comprei uma mala e uma passagem e fui com o Hermeto pro Rio…ele não imaginava que eu já iria no dia seguinte ao show, mas já tinha avisado minha mãe…só no Rio, após uma semana ensaiando com o Elísio percebi que o Hermeto estava de olho em mim como mulher…a essa altura já sabia que ele estava viúvo há dois anos e quando soube como pensava e acreditava nas mesmas coisas que eu, na minha cabeça uma intuição me dizia: “_Vá por aí que vc está certa!” E eu me entreguei de corpo, alma e coração!

7. Revista do Choro: Qual era a diferença de idade entre vocês dois?

Aline Morena: 43 anos

8. Revista do Choro: Essa diferença surtiu algum problema na relação de vocês?

Aline Morena: Na cabeça, o Hermeto sempre foi mais novo do que todos os meus namorados! Eu jamais ficaria com um “velho”! Eu tinha 23 anos e ele 66! E por dez anos, vivi plenamente a vida de casal com ele. Depois disso, comecei a abraçar ele e senti-lo mais como meu pai do que meu marido, aí a diferença de idade pegou sim e a partir de então, depois de uma depressão, começou o processo de separação como casal…

9. Revista do Choro: Quanto tempo durou essa relação?

Aline Morena: 12 anos como casal, e 13 anos me apresentando com ele.

10. Revista do Choro: Vocês chegaram a morar juntos?

Aline Morena: Sim, por 12 anos.

11. Revista do Choro: Como era esse cotidiano com o Hermeto, que perpassava uma relação amorosa e artística?

Aline Morena: Na música ele adiantava pra mim tudo o que eu iria passar na vida artística…e na relação amorosa eu fiz tudo por ele e ele fez tudo por mim. Foi, com certeza, minha alma gêmea, no sentido de que o Hermeto foi a pessoa com quem mais tive afinidade de pensamento e de alma.

12. Revista do Choro: Quantos projetos vocês produziram juntos, e qual foi o resultado do encontro Hermeto e Aline, Aline e Hermeto?

Aline Morena:

1. CD e DVD “Chimarrão com Rapadura”, em duo com ele;

2. CD “Bodas de Latão”, em duo também;

3. CD “Sensações”, CD solo meu mas dirigido por ele;

4. DVD “Hermeto Brincando de Corpo e Alma”, DVD do Hermeto todo produzido por mim;

5. 12 anos de shows e workshops pelo Brasil e no exterior, por mais de 30 países;

6. Livro de partituras “Aline Morena por Hermeto Pascoal”! Lançado no Brasil pela editora paulistana Laranja Original. Com duzentas composições do Hermeto, de “Aline Morena 1” a “Aline Morena 200”, que ele me dedicou.

13. Revista do Choro: Porque a relação entre vocês em nível amoroso terminou?

Aline Morena: Respondi na pergunta 8.

14. Revista do Choro: Depois que relação acabou vocês continuaram sendo amigos. Como foi?

Aline Morena: Não sabia se ao me separar o Hermeto me manteria em suas formações musicais. Tinha lançado meu CD solo com um grupo formado para o lançamento…não tinha carreira solo…porque me apresentar com o Hermeto em suas formações era pra mim, muito melhor que seguir carreira solo…mas o Hermeto nunca me tirou das formações dele…Eu continuei por mais um ano no grupo dele e depois eu decidi sair e seguir minha vida de forma totalmente independente.

15. Revista do Choro: Quando ele partiu, recentemente, há um mês atrás, vocês já não estavam juntos há bastante tempo. Como você sentiu a passagem do Hermeto Pascoal?

Aline Morena: Eu senti um aperto no coração por volta de 20h30 do dia 13 de setembro. Estava assistindo um filme com meu esposo Valdir. Até comentei com ele o desconforto. Meia hora depois, o amigo sanfoneiro Saraiva me ligou avisando da passagem do Hermeto. Aí olhei no WhatsApp e mais um amigo já havia avisado. Em seguida, a imagem do Hermeto veio na minha frente, todo sorridente, bem leve, desprovido de ego, me dando um tchau. Ele estava bem feliz. Eu tenho certeza que o Hermeto está numa melhor agora. Passado um mês, quando ele me vem à mente, quase todos os dias, eu custo a acreditar que ele não está mais aqui, principalmente porque sinto ele bem perto, como sempre. Mesmo depois de separados, sempre liguei pra ele, mantivemos o amor, o respeito. o carinho, a amizade e a gratidão. Quando gravei meu CD solo “Aline Morena Convida”, sempre ligava pra ele contando tudo o que estava fazendo. Ele aprovou tudo o que fiz e isso me deixa muito orgulhosa!

16. Revista do Choro: O que você guarda num canto especial do seu coração da convivência que teve com ele, dos projetos que desenvolveram juntos, e do amor que compartilharam e viveram?

Aline Morena: Uma gratidão eterna pelo privilégio que tive de compartilhar 12 anos da vida e fazer música com ele por 13 anos, aprendendo tanto que pretendo um dia lançar um livro de memórias pra compartilhar um pouco desses ensinamentos e momentos únicos.

7. Revista do Choro: Qual a maior mensagem que Hermeto Pascoal deixou para você?

Aline Morena: Ssão muitas, mas três nunca me saem da cabeça: “Viva e deixe viver!”, “O pouco com Deus é muito e o muito sem Deus é nada!” E “Cada pessoa nasce com um alcance diferente!”

18. Revista do Choro: Falando da obra dele, o que você considera mais importante, o que considera mais genial, criativo, e o que você acha que não pode deixar de ser conhecido pelas próximas gerações?

Aline Morena: Sugiro conhecer o Hermeto em todas as suas formações e procurar conhecer o maior número possível de suas obras para ter uma ideia um pouco mais completa e abrangente sobre a Música Universal, como ele mesmo batizou. Porque as obras dele abrangem desde o mais simples até o mais complexo, e é um retrato sonoro da vida em todos os seus aspectos e nuances.

19. Revista do Choro: Caso exista alguma coisa que eu não tenha mencionado e você queira colocar aqui nesse espaço, fique à vontade para comentar.

Aline Morena: Agradeço a oportunidade, Leonor e a Revista do Choro de poder deixar este depoimento sobre alguém tão importante, o Mestre dos mestres da música no mundo, e, ao mesmo tempo, um mestre na arte de viver, o eterno Hermeto Pascoal.

 

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Author: imprensabr

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