Leonor Bianchi
O Jornal Correio da Manhã do dia 23 de abril de 1968, uma terça-feira, auge da ditadura militar no Brasil, noticiou a ida de Pixinguinha ao Museu da Imagem e do Som para registrar seu tão famoso, conhecido e valioso depoimento. O segundo, pois o primeiro ele havia gravado dois anos antes.
É sobre esse momento histórico para o choro, documentado nas páginas do Correio da Manhã, que fala o programa de abertura da série A história do choro através da imprensa, que estou produzindo, e que será disponibilizado aqui na Revista do Choro e no canal da revista no YouTube. Clique aqui para saber mais.
Título da matéria:
Pixinguinha grava para a posteridade
Emocionado até as lágrimas e sempre com voz embargada pelas recordações de fatos de sua vida que considera simples demais para merecer tanta importância, Pixinguinha foi ontem mais uma vez homenageado ao prestar depoimento para a posteridade no Museu da Imagem e do Som, um dia antes de completar 70 anos de idade.
Pixinguinha não queria, mas quem acabou convencendo o músico a gravar o depoimento foi o diretor do Museu, Ricardo Cravo Albin, que mandou um carro apanhá-lo em sua residência, na rua que hoje leva o seu nome, em Ramos.
Acompanhado de seu filho único e do velho amigo músico João da Baiana, de 81 anos de idade, Pixinguinha chegou à praça Marechal Âncora dizendo-se muito nervoso e sem condições de resistir a tantas homenagens mesmo “porque afinal nada fiz de importante na vida”, afirmava.
Hermínio Bello de Carvalho, atual parceiro de Pixinguinha, Jacob do Bandolim, além do próprio diretor do Museu da Imagem e do Som foram os que organizaram as perguntas sobre a vida do músico e compositor, considerado um dos mais expressivos da genuína música popular brasileira.
Vocação
O depoimento, ontem, de Pixinguinha, foi o segundo que fez e completa um primeiro que havia gravado dois anos antes.
Pixinguinha relatou que não sabe ao certo onde nasceu, enquanto Jacob do Bandolim afirmava que havia sido na rua Gomes Serpa, na Piedade. Entretanto, disse que se criou no Catumbi, onde sentiu despertar a vocação para a música, lembrando também que foi batizado na igreja de Sant’Ana, na praça onze.
Declarou Pixinguinha que também não sabe com certeza o total de músicas que compôs, mas acha que chega a quase mil, a maioria de grande sucesso, geralmente com títulos de nome de mulher, e muitas ainda inéditas, para o público. De vez em quando, João da Baiana interrompia, insinuando que várias músicas inspiraram-se em mulheres que Pixinguinha conheceu.
Confessou o músico que a mulher com quem veio a se casar, em 1927, dona Albertina da Rocha Viana, nunca foi título de música sua, tendo-lhe dedicado a valsa “Querendo bem”, que nunca foi gravada. Pixinguinha conheceu dona Beti, como a trata, no Teatro Real, durante uma sessão da Cia. Negra de Revistas, em que ela era cantora. Nesse espetáculo tocava tuba o hoje consagrado maestro Eleazar de Carvalho.
Compôs de tudo
Pixinguinha revelou, também, que já compôs de tudo, pois nos teatros era obrigado a tocar música de acordo com o quadro apresentado, tendo criado músicas no ritmo de praticamente todos os países. E frisou: “Enquanto for vivo comporei, e acho que sou capaz até de fazer iê iê iê”.
Já tenho composto até música sacra, recentemente Pixinguinha musicou dos filmes: Sol sobre a lama e Um dia qualquer. Contou que sua música preferida é o choro Ingênuo, de 1948.
O grande sucesso, disse, foi “Carinhoso”, que tinha sido rejeitado para ser gravado por Francisco Alves e Carlos Galhardo. Quem gravou a música afinal foi Orlando Silva, que obteve com ela enorme popularidade. “No início – disse Pixinguinha – Carinhoso era uma polca lenta, passando-se depois para choro, sendo estilizada para virar samba, finalmente.”
A primeira gravação de Pixinguinha foi feita em 1914 com as músicas ‘São João de baixo d’água’ e ‘Aí, Morcego’, mas começou a compor com 13 anos de idade, escrevendo o choro ‘Lata de leite’, inspirado na valsa ‘Tristeza não paga dívidas’, de autoria de seu pai.
Pixinguinha é funcionário aposentado do Estado, tendo entrado para a antiga prefeitura como fiscal de departamento de limpeza urbana, passando posteriormente a ocupar a função de auxiliar de escrita, e finalmente professor de música. Nessa última função lecionou músicas nos colégios João Alfredo, onde dirigiu a banda colegial, e Licínio Cardoso.
Prefere Chico
Em 1921 viajou para a Europa, por contrato, com o seu grupo de músicos que dominou “Os Batutas”. Em Paris, Pixinguinha passou seis anos fazendo sucesso, tendo como companheiros: Donga, China, Nelson e José Alves, Luiz Pinto, Feniano e José Monteiro. Em 1927 viajou para a Argentina, igualmente com “Os Batutas”.
Pixinguinha encerrou seu depoimento no MIS relutando um pouco em falar dos compositores atuais, alegando que considera a todos como amigos, mas não pode ocultar que o seu predileto é Chico Buarque de Holanda.
A matéria traz uma foto de Pixinguimha cuja Legenda diz:
Dizendo que não havia motivo para homenagens, Pixinguinha ficou emocionado.
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A matéria não foi assinada por nenhum jornalista.
Reproduzi o artigo publicado no Correio da Manhã integralmente e optei por não utilizar aspas.
A fonte utilizada para a pesquisa ddste projeto está sendo a Hemeroteca Digital da Fundação Biblioteca Nacional.
Fonte da foto que ilustra este artigo na homepage do site da Revista do Choro: Acervo Pixinguinha, Instituto Moreira Salles.
Assista ao vídeo deste episódio da série A historia do choro através da imprensa no canal da Revista do Choro no YouTube.
