No domingo 24 de janeiro de 2016, a Revista do Choro começou a publicar o livro Pensadores do Choro na íntegra para seus assinantes. A cada domingo um novo capítulo vem sendo publicado desde então. Após publicarmos o artigo Tudo Culpa do Choro, do autor Sergio Aires, contemplado pelo prêmio literário promovido pela Revista do Choro e e-ditora] (www.portaldaeditora.com.br), em 2014, estamos publicando o texto de Vanessa Trópico vencedor do edital: O choro marajoara de Adamor do Bandolim e um breve relato da história do choro no Pará. Leia hoje o segundo capítulo do mesmo.
Boa leitura!
Por volta de 1958, já residindo em Macapá, através de sua professora Walkiria Lima, Adamor passa a ter envolvimento com o maior movimento de educação musical em massa já ocorrido no Brasil: o Canto Orfeônico, ligado ao governo de Getúlio Vargas e que teve à frente o maestro Heitor Villa-Lobos.
Dentro desse contexto, Adamor passa a fazer parte do ciclo de amizade dos músicos do regional de choro da rádio difusora da cidade. Com seu amigo Zé Crioulo, mergulhou, por dois meses, com instrumento emprestado, nos ensaios de Pedacinho do Céu, composição de Waldir Azevedo.
Nessa fase, Adamor já tocava o cavaquinho em sua afinação natural específica para solo MI, SI, SOL, RE. Para conseguir ensaiar, dizia a sua mãe que estava frequentando as novenas das Santas Missões da igreja próxima de sua residência. Assim que o sino tocava, anunciava o final do ensaio. Adamor voltava correndo para casa, pois sua mãe era uma mulher muito zelosa:
“- Ela tinha um ciúme de mim e do meu irmão como se fôssemos moças e, nessa época, por lá, nem se falava em drogas”, relembra nosso Chorão.
Por conta dos ensaios, Adamor quase foi reprovado na escola, ficando para o segundo período (recuperação).
Após ver a apresentação de Gercino Pacheco, bandolinista, no programa de calouros ‘Alô, Brotos’, desta mesma emissora de rádio de Macapá, Adamor decidiu participar do concurso de calouros. Nosso Chorão ressalta que eles só sabiam a música Pedacinho do Céu, mas, mesmo assim foram à rádio. No dia da apresentação, um domingo, seu companheiro não teve a mesma coragem ao ver os outros participantes se apresentarem. Conversou com os organizadores e disse que apenas Adamor iria se apresentar. Saiu da sala para fumar um cigarro tranquilizando Adamor quanto ao tempo e a ordem de apresentação dos músicos, dizendo que a dupla seria a sétima a ser chamada, quando, na verdade, eles eram os terceiros. Adamor foi surpreendido quando o locutor anunciou seu nome para apresentação de um número de cavaquinho e, num sobressalto levantou da cadeira para chamar o amigo pelo vidro. Foi quando viu Zé Crioulo sorrindo e fazendo um sinal com a mão que dizia “se vira!”. Quando Adamor quis sair daquela situação, já era tarde, pois o apresentador já pedia para a plateia aplaudir o calouro.
De tão nervoso, Adamor não achou a palheta no bolso pequeno da calça. O bandolinista do regional da rádio, Amilar Brenha, tentou lhe emprestar uma palheta, a qual Adamor não conseguia sequer segurar. Tocou com as pernas trêmulas e com auxílio de um pedaço de piaçava de vassoura. Quando o regional começou a fazer a introdução, Adamor sentiu segurança e tocou, pedindo a Deus para não errar nenhuma nota, pois tinha medo de ser vaiado. Ao contrário do imaginado, por seu temor, foi muito aplaudido. O garoto de Anajás ganhou no concurso seu primeiro cachê, no valor de duzentos cruzeiros.
Emocionado ao ouvi-lo na rádio, Osvaldino presenteou Adamor com um cavaquinho, reconciliando-se com o filho.
Adamor compôs uma valsa, ainda inédita, chamada Sempre Viva, dedicada ao pai e registrou a música em gravação não profissional apenas uma vez.