Octávio Dutra 130 anos


Por Leonor Bianchi e Rúben Pereira

O Compositor e Professor Octávio Dutra nasceu em Porto Alegre no dia 03 de dezembro de 1884.

Filho do advogado Miguel Antônio Dutra Filho e de Leopoldina Dutra. Ingressou na Escola de Belas-Artes, onde teve como mestre o professor Murilo Furtado. Octávio Dutra Iniciou seus estudos musicais em 1910, no Conservatório de Música de Porto Alegre, onde cursou harmonia e contraponto. Casou-se com Diamantina, com quem teve duas filhas, e a quem dedicou valsa do mesmo nome.

Em 1889, aos 15 anos de idade fez sua primeira obra, a valsa intitulada “Valsa nº 1”. Entre os anos de 1900 e 1904, compôs a “Valsa nº 2”, a valsa “Sonâmbula”, a “Valsa nº 3”, a “Valsa nº 4”, a valsa “Mocinha” e a “Polca B”. Acredita-se que, durante esses anos, tenha composto marchas-rancho para os blocos carnavalescos de Porto Alegre.

De 1910 a 1937, Dutra organizou cursos de canto e música, lecionando teoria musical, harmonia e canto. É considerado o pioneiro na introdução do bandolim e do violão na sociedade gaúcha. Adepto do Choro, é dos primeiros a cultivar o gênero no sul do País.

Foi ensaiador dos primeiros blocos de Porto Alegre, como os “Tigres”, “Os Batutas”, chegando a fazer para eles diversas orquestrações e arranjos. Em 1913 registrou em selo Odeon pela Banda do 10º R. I. do Exército as polcas “Pinhão…quente” e “Bela porto-alegrense”, o xote “Céu aberto” e o tango “Choro dos becos”. No mesmo ano, também na Odeon, seu grupo ‘Terror dos Facões’ gravou os xotes “Coração de ouro” e “Sempre teu”, a polca “Mágoas do violão” e a valsa “Republicana”. Outra de suas composições gravadas, sem data precisa, foi o xote “Alda”, pelo Grupo do Canhoto.

O ‘Terror dos Facões’

Em 1914 organizou em Porto Alegre o grupo “Terror dos facões”, integrado por flauta, cavaquinho e violão. O “Terror dos facões” (em gíria dos Chorões, facão significa pessoa que toca mau um instrumento) tinha seu repertório formado, principalmente, por composições da autoria de Octávio Dutra, chegando a lançar no ano de sua formação diversos discos para a gravadora Odeon.

No início de 1915, o compositor causou espanto no Rio de Janeiro ao registrar, de uma só vez, na seção de Direitos Autorais da Biblioteca Nacional, trinta composições, visando manter preservados seus direitos, cedidos a Frederico Figner, proprietário da Casa Edson e diretor-geral da Odeon brasileira. Deixou inúmeras composições, tendo cultivado todos os gêneros musicais populares, com especial atenção para o gênero valsa.

Episódio marcante da vida artística

Um episódio marcante na carreira do chorão Octávio Dutra aconteceu em 1921, aos seus 36 anos, durante um desfile de carnaval em Porto Alegre. Segundo o jornalista e pesquisador de música brasileira Ary Vasconcelos, “os blocos rivais ‘Tigre’ e ‘Batutas’ encontraram-se em plena Praça Garibaldi, em Porto Alegre. Os primeiros cantavam um samba do maestro Pena, ironizando os blocos rivais: “Vai botá isso lá”. Octávio Dutra improvisou, na hora, uma resposta, que superou a música dos ‘Tigres’; o samba “Bota fora esse negócio”. Logo em seguida, por iniciativa de Dante Santoro, que se achava presente na ocasião, foi executada a valsa “Palmira”, de Dutra, com Santoro fazendo o solo de flauta. O compositor foi carregado em triunfo pelo povo”.

A sétima arte descobre Octávio Dutra

O compositor e instrumentista gaúcho foi tão importante no cenário cultural do Rio Grande do Sul, que ainda hoje, 130 anos após seu nascimento, sua arte e presença continuam crescentes naquele estado. Prova disto é o filme Espia Só [2013], documentário musical realizado por Saturnino Rocha. Em depoimento à Revista do Choro, ele conta como foi a descoberta desta grande personagem e a ideia de fazer o filme.

– “Por ocasião da produção de um documentário musical sobre o Tango em Porto Alegre, “Tango, Uma Paixão”, filmamos um depoimento com o músico e pesquisador musical Hardy Vedana. Ao final da filmagem, o maestro Vedana me presenteou com um livro de sua autoria, “Octavio Dutra na História da Música de Porto Alegre”, sugerindo que ali estaria uma obra musical e uma figura merecedoras de um filme. A partir da leitura do livro e do contato com a obra de Dutra, através do músico e pesquisador Arthur de Farias, fomos cooptados pela qualidade da obra e pelo relativo desconhecimento da mesma, que culminaram na produção do Espia Só”.

O filme estreou em novembro de 2012 em Porto Alegre e já foi exibido no glamoroso Festival de Cinema de Gramado naquele mesmo ano, no Festival de Santa Maria, em 2013, no Festival Internacional de Punta del Leste, no Uruguai, em 2013. Foi eleito o melhor filme gaúcho em 2012, através do Prêmio “César Luiz Cozzatti”, pela Associação de Críticos de Cinema – RS e foi exibido nos circuito de Porto Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo.

Edital de fomento à cultura viabiliza digitalização e catalogação do acervo do compositor e instrumentista

Em 2014, uma equipe coordenada pelo Professor Márcio Souza foi contemplada pelo programa Rumos do Itaú Cultural com o projeto de Catalogação do acervo do maestro Octávio Dutra, trabalho este que está sendo realizada na UFPEL, pelo Professor e equipe. O trabalho deve estar pronto e disponibilizado em janeiro de 2016, com um Livro de partituras de algumas obras do maestro. “O acervo tem de tudo que se possa imaginar de um grande músico, mais de 3.000 itens neste acervo, que é vastíssimo e sensacional”, disse Saturnino Rocha.

Acervo de Octávio Dutra é um dos mais importantes do Choro

Compondo um dos mais importantes acervos do choro, o acervo do compositor Octávio Dutra e o projeto de digitalização do mesmo estão sob a batuta do pesquisador e professor Marcio Souza.

Em depoimento à Revista do Choro ele conta que: “Recebi o convite para coordenar o Catálogo Octávio Dutra do produtor Carlos Peralta. Ele já havia coordenado e idealizado o documentário Espia só… sobre este compositor gaúcho da primeira metade do séc. XX,  no qual participei com depoimentos e informações biográficas, artísticas e documentais sobre ele. Na verdade eu já pesquiso a obra de Octávio Dutra desde o ano de 2000. Em 2003 lancei o CD “Espia só o violão de Octávio Dutra” que teve uma repercussão muito positiva, sendo relançado em 2005 pela Revivendo. Finalmente em 2010 defendi minha tese de doutorado em História Cultural (PUCRS) sobre a sua obra intitulada “Mágoas do violão: mediações culturais na música de Octávio Dutra”. Enfim, já faz bastante tempo que estou envolvido com a obra deste compositor. O projeto do catálogo é ambicioso, pois envolve um livro impresso, um álbum/CD de partituras e também toda a digitalização e catalogação do acervo, guardado pela família desde sua morte em 1937. A partir do contato com o Peralta, começamos a planejar a execução através de um convênio ou parceria público privada entre a Guarujá Produções e a Universidade Federal de Pelotas (UFPel), instituição na qual sou professor adjunto. Dentro da UFPel temos o Laboratório de Ciências Musicais onde estamos trabalhando na higienização, inventário, catalogação com vistas a confecção do catálogo biográfico e musical de Octávio Dutra.  A UFPel tem contribuído com o apoio estrutural e tecnológico para a realização do projeto” relata Márcio Souza, que completa dizendo “O apoio financeiro veio do Itaú Cultural através do projeto Rumos, através de um edital muito concorrido. Isso gera uma grande responsabilidade na qualidade de execução do catálogo e ao mesmo tempo uma tranquilidade de que tudo conseguirá ser feito da melhor forma possível para fazer jus à memória deste importante músico brasileiro”.

Catálogo estará disponível até o fim de 2015

“No acervo de Octávio Dutra podemos encontrar em síntese a história do choro, as transformações da música brasileira durante a Primeira República (1889-1930), o hibridismo dos gêneros musicais como a polca-choro, o maxixe, o tango brasileiro e também as valsas seresteiras. Encontramos também muita música e texto para o antigo Teatro de Revista, jingles sobre produtos do comércio de Porto alegre, música para cordões carnavalescos, arranjos para orquestra e regional da primeira fase do rádio no Brasil. Enfim, um tesouro musicológico a ser estudado e preservado. Constam também diversos cadernos de choro, como era comum á época os chorões registrarem suas composições, de amigos, colegas e artistas de renome nacional. Dutra guardou cadernos de flauta, bandolim, saxofone, violão, sax entre outros instrumentos” enumera o Professor Souza.

Ainda estamos estudando o destino físico do acervo, pois entendemos a necessidade de encontrar um espaço adequado para a sua preservação e consulta eficiente. Essa etapa será delineada no decorrer do processo, pois envolve negociação com a família e entidades públicas que melhor se identifiquem com o tipo de acervo. Mas, a digitalização e catalogação, neste momento, é o passo mais importante para preservar e disponibilizar o material.

Estamos em pleno processo de catalogação e digitalização. Creio quem até o final de 2015 teremos o catálogo finalizado. Como alguma parte necessita restauro e muitos documentos estão incompletos ou fora da ordem, o tempo estimado pode se alterar um pouco. Tenho ainda a função de redigir os textos do catálogo, o que demanda análise, reflexão e conhecimento de todo o conteúdo do acervo.

Contribuição de Octávio Dutra para o Choro e a música gaúcha é destacada pelo Professor Márcio Souza

“Octávio Dutra foi um mediador da música em sua época. De acordo com o contexto musical da cidade de Porto Alegre, uma cidade provinciana e afastada dos grandes centros, esse artista teve que atuar em diversas áreas e assumir muitas funções dentro do ofício da música. Oscilou entre tradição e modernidade dentro da música brasileira. No entanto, sem optar por regionalismos radicais, esteve sempre em sintonia com a música brasileira de sua época, como Ernesto Nazareth, Chiquinha Gonzaga, Pixinguinha, Garoto, Catullo, Noel Rosa, entre tantos outros grandes músicos. Foi um chorão tradicional do bandolim e violão, mas atuou também nas serestas, saraus, teatros, cassinos, carnaval de rua, rádios e cinema mudo. A partir do seu ingresso no Conservatório de Música em 1909 pode registrar e arranjar suas composições, o que foi muito importante para o legado que temos hoje. Além disso, imprimiu aproximadamente duas dezenas de partituras e também gravou inúmeros discos com seu lendário grupo Terror dos Facões para a Casa Elétrica e Casa Edson entre 1913 e 1919. Deixou muitos discípulos como Dante Santoro, Jessé Silva, Ney Orestes, Gustavo Ribeiro, entre tantos outros. Dutra, em sua época, chegou a ser considerado “o violão de estimação da cidade” conclui o Professor da UFPel e responsável pela digitalização e catalogação da obra e acervo de Octávio Dutra, Márcio Souza.

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Author: imprensabr

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