O Colecionador. Entrevista com Sandor Buys


O colecionador Sandor Buys

O colecionador Sandor Buys

Revista do Choro: Desde quando você é colecionador?

Quando era estudante do ensino médio já comprava muitos LPs e livros em sebos, comecei a juntar uma razoável biblioteca sobre cultura popular brasileira nesta época. Mas vim a ter uma coleção significativa mais tarde, depois de conhecer colecionadores de discos e livros, o que aconteceu lá pelo final da década de 1990. Com os colecionadores, aprendi sobre a música brasileira das primeiras décadas do século XX e passei a me dedicar muito a buscar material deste período.

Revista do Choro: Qual o objeto mais raro da sua coleção?

Sandor Buys: Não sei ao certo. Talvez o mais importante que tenha conseguido reunir seja uma coleção representativa de discos brasileiros mecânicos, que são aqueles produzidos antes do uso do microfone elétrico, entre 1902 e 1927. Além de uma boa amostra de discos brasileiros feitos no final da década de 1920 até os anos quarenta.

Revista do Choro: Onde você abriga seu acervo? As pessoas podem visita-lo, há uma área de exposição permanente de parte do acervo?

Sandor Buys: Está tudo na casa onde moro. Uma casa pequena, onde não há espaço para exposições permanentes, mas gosto quando pessoas se interessam em conhecer.

Revista do Choro: Já cedeu algum objeto do acervo para alguma exposição importante? Qual?

Sandor Buys: Nunca fui procurado para ceder material para exposição. Mas tenho material que adquiro especialmente pensando em expor. Por exemplo, tenho uma boa parte da bibliografia inicial sobre música brasileira.  Livros em estado de conservação muito bom e que não costumo manusear para não causar danos.

Revista do Choro: Você já recebeu visitantes de todo mundo, creio. De quem você nunca se esquecerá?

Sandor Buys: Não, não recebi visitantes de todo o mundo. Pode acreditar que o interesse por este material não é tão grande assim. Um momento inesquecível que me veio agora à mente aconteceu em 2009, quando reuni toda esta coleção na casa onde moro atualmente. As coisas estavam dispersas em mais de um local. Então, fiz uma festa de inauguração simbólica da coleção no dia 23 de abril, dia do aniversário do Pixinguinha.

Revista do Choro: Você vende (troca) os objetos do acervo?

Sandor Buys: Não vendo nada, já troquei discos repetidos.

Revista do Choro: O que você faz na maior fundação de pesquisa em saúde do Brasil, a Fiocruz?

Sandor Buys: Minha formação básica é em Ecologia, atualmente sou pesquisador visitante da Fiocruz e trabalho com insetos, incluindo biologia, comportamento, taxonomia e morfologia. Venho me aproximando da conservação ambiental e da saúde pública.

Cilindros de cera - uma das primeiras tecnologias de registro de som. Acervo Sandor Buys.

Cilindros de cera – uma das primeiras tecnologias de registro de som. Acervo Sandor Buys.

Revista do Choro: Você já recebeu doações de algum notável (ou familiares) da música brasileira? Conta rapidamente pra gente essa estória…

Sandor Buys: Não, já ganhei muitos discos de várias pessoas. Conheci as famílias de alguns músicos que tiveram êxito no passado, mas nunca ganhei ou comprei material deles.

Revista do Choro: Você só coleciona objetos relacionados a música popular brasileira?

Sandor Buys: Basicamente sim, mas tenho um bom material de livros e revistas sobre cultura popular brasileira também.

Revista do Choro: Em relação ao Choro, o que você nos apresentaria de seu acervo?

Sandor Buys: Principalmente discos de 78 rotações, especialmente anteriores a década de 1940. Bastante coisa de livros e revistas também.

Revista do Choro: Você tem o original do livro O Choro, do Animal?

Sandor Buys: Sim, tenho a primeira edição, que é muito rara mesmo. É um destes livros interessantes para uma exposição.

O Choro_1936

Revista do Choro: Você precisa recorrer às leis de incentivo à cultura para manter seu acervo organizado e com o mínimo de dignidade?

Sandor Buys: Nunca recorri a leis de incentivo.  O acervo é pessoal e relativamente bem organizado.

Revista do Choro: Seu acervo está online?

Sandor Buys: Não. Não tenho tempo nem equipamento para digitalizar discos ou escanear bibliografia com boa qualidade. Realmente não tenho uma instituição, tenho apenas uma coleção particular, que se torna comparativamente grande e importante devido à carência de instituições públicas que supram o papel de cuidar da nossa memória musical.

Revista do Choro: Pesquisadores podem procurá-lo para conversar?

Sandor Buys: Sim, claro, às vezes me procuram.

Revista do Choro: Deixe um contato seu pra quem se interessar e quiser trocar figurinha.

Sandor Buys: O Facebook é ótimo para este tipo de contato. Além disto, meu e-mail é sandor.buys@gmail.com.

Revista do Choro: Você compõe. Onde estão suas canções?

Sandor Buys: Sim, componho. Não tenho nenhuma atividade profissional ligada a isto, nem nunca tive oportunidade de estudar música mais a fundo, como bem gostaria. Comecei a mostrar minhas composições há pouco tempo, ano passado organizei um primeiro show em um centro cultural municipal no bairro de Santa Teresa. Já mostrei músicas para alguns intérpretes que se interessaram bastante. Gosto muito de compor, tenho algumas dezenas de músicas prontas e várias outras por terminar, pretendo investir mais nisto.

Revista do Choro: Dentre os instrumentos de sua coleção, quais pertenceram a grandes nomes da música brasileira? Tem instrumento de Pixinguinha, de Garoto, de Villa Lobos?

Sandor Buys: Realmente tenho alguns instrumentos, principalmente de corda, mas não é uma coleção importante. Gosto de violas e rabecas brasileiras e instrumentos populares da América do Sul em geral. Se pudesse estudar música, acho que tocaria vários instrumentos de corda.

Já me ofereceram material de alguns artistas bem consagrados da música brasileira, mas minha busca sempre foi pelo menos conhecido. Já deixei, por exemplo, de comprar material sobre o Pixinguinha e a Carmen Miranda para comprar coisas de músicos menos conhecidos. Veja que já existem pessoas cuidando, um pouco pelo menos, da memória do Pixinguinha e da Carmen Miranda. Também existe o Museu Villa Lobos e existem biografias e discos revendo o repertório do Garoto, que são artista que você citou na pergunta. Mas, por outro lado, há um enorme vácuo sobre nomes de grande importância na música brasileira do passado, artistas de grande talento musical são inteiramente esquecidos. Eu sempre me propus principalmente a reunir material e tentar cuidar um pouco da memória destes nomes menos conhecidos hoje em dia.

Revista do Choro: Como Você vê hoje o ambiente de pesquisa e publicações sobre música no Brasil, sobre a música popular brasileira?

Sandor Buys: Vejo um crescimento das pesquisas em música. Por exemplo, sobre a indústria fonográfica brasileira há um bom número de publicações recentes. Sobre choro, temos importantes projetos que surgiram dos anos 2000 para cá, como “Princípios do choro”, “Pixinguinha na pauta”, esta ideia de desenvolver o Instituto Casa do Choro e várias outras coisas. Acho muito importante também o crescimento da pesquisa acadêmica em música. Acho ótimo ver estudantes de Música e também de História, de Letras, de Antropologia e outras áreas do conhecimento fazerem suas teses acadêmicas em música. Pena que muitas teses e dissertações não são publicadas poderia haver mais incentivo para a publicação destes trabalhos. Vejo com tristeza que há certa rejeição da pesquisa acadêmica em música dentro de alguns ambientes. Eu mesmo já sofri rejeição por ter uma formação acadêmica, como se a música fosse assunto só para músicos ou biógrafos e críticos. Espero que cresçam ainda mais e se diversifiquem as abordagens de pesquisa em música brasileira.

Revista do Choro: Você tem centena de artigos publicados em importantes revistas científicas, tem escritos sobre música também? O que?

Sandor Buys: Pois é, tenho um envolvimento profundo com o ambiente acadêmico em biologia, isto dificulta que eu escreva sobre música também. Mas tenho publicado notas biográficas sobre músicos brasileiros e textos sobre cultura popular em revistas e jornais. Espero finalizar este ano ainda um livro sobre a música brasileira gravada em disco nas primeiras décadas do século XX, no qual tenho trabalhado há alguns anos. Também tenho trabalhado em uma coletânea de crônicas, onde quero passar um pouco das histórias cotidianas que vivenciei com os velhos colecionadores e ainda apresentar dados biográficos de alguns músicos do passado.

imprensabr
Author: imprensabr

Leave a comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *