O chorão Villa-Lobos e suas composições ‘Suite Popular Brasileira’ e ‘Choro N.1’


Leonor Bianchi

Hoje acordei lendo o livro ‘Heitor Villa-Lobos – sua obra para violão’, do violonista Marco Pereira (Musimed, 1984).

A promoção que a Revista do Choro está promovendo, sorteando um violão (de 6 ou 7 cordas) construído por um dos maiores luthiers do mundo, o brasileiro Lineu Bravo, está me fazendo viajar profundamente pela história do instrumento.

Tenho lido muita coisa sobre violão e conversado com muitos violonistas, produtores musicais, pesquisadores. E estou cada vez mais apaixonada pelo instrumento e sua história.

Heitor Villa-Lobos, um dos nossos maiores violonistas, está sempre entre os meus ‘professores’ preferidos sobre o tema, e esta semana ‘desci’ este livro do Marco Pereira das prateleiras da ‘biblioteca do choro’ para ler alguns trechos com mais atenção. Digo isso porque trata-se de uma leitura extremamente técnica e eu não sou musicista. Mas a leitura, que num primeiro momento pode vir a ser algo muito específico para um leigo torna-se acessível se o leitor conhece um pouquinho da obra de Villa-Lobos.

A escrita é didática, ilustrada por trechos das partituras das peças de Villa citadas pelo autor.

O texto analisa a obra de Villa-Lobos e a partir dela busca entender sua importância para o desenvolvimento da literatura e da técnica do violão.

E, como um dos meus objetivos nessa longa jornada do estudo do instrumento segue para além do interesse em conhecer sua história e passa também por entender suas possibilidades sonoras e a criatividade das grandes personagens e virtuoses que contribuíram para que o violão se tornasse o instrumento mais popular, e contraditoriamente erudito do planeta, a leitura está sendo bastante enriquecedora.

Suite Popular Brasileira

Dos seis capítulos que compõem o livro, destaco o quatro e o cinco. No capítulo quatro, o autor trabalha com as peças que compõem a Suite Popular Brasileira: mazurka-choro, schttish-choro, valsa-choro, gavota-choro, e chorinho, de Villa-Lobos. No capítulo cinco, ele comenta o Choro N.1 de Villa.

Ambas as composições de Villa-Lobos são lembradas no verbete sobre o maestro no site Acervo Digital do Violão Brasileiro, pelo violonista e pesquisador Gilson Antunes:

As primeiras obras de Villa-Lobos para violão solo que constam no repertório dos violonistas são pequenas peças que foram incluídas para edição na década de 1950: a Suíte Popular Brasileira. As quatro primeiras músicas (Mazurca-choro, Schottisch-choro, Valsa-Choro e Gavota-Choro) foram compostas em forma embrionária provavelmente entre 1906 e 1912, e a última – Chorinho – em 1923. Inicialmente, a Valsa-Choro não constava na primeira compilação da Suíte em 1928, e sim a Valse-Choro, mas esta acabou ficando de fora da edição oficial.

As obras que compõem a Suíte Popular Brasileira foram aprimoradas para a edição, o que então se pode considerar como período de composição, entre 1908 e 1953. Antes dessas obras, Villa-Lobos já havia composto a Valsa de Concerto nº 2, em 1904, obra que se encontrava perdida e que foi encontrada num sebo em São Paulo em 1995, mas que ainda não faz parte do repertório geral do compositor como as outras obras editadas em 1955. O mesmo se pode dizer da já citada Valse-Choro, descoberta pelo violonista Fréderic Zigante nos arquivos da Editora Max-Eschig, em 2005″.

Screenshot_2018-08-26-12-34-06

Fonte: http://www.villalobos.ca/suite-populaire

Voltando ao livro do Marco Pereira, muito vale (re)ler esses dois capítulos para compreender melhor a relação íntima que Villa-Lobos tinha com o choro.

“A Suite Popular Brasileira, denominação dada comprar vontade do compositor, foi escrita entre 1908 e 1912. Relaxe compõe de 5 peças elaboradas segundo a tradição dos choro (entenda-se conjunto instrumental) da região urbana do Rio de Janeiro do início do século 20.

Na realidade, o Chorinho, que é a quinta peça desta suite foi criado bem mais tarde, em 1923, durante a primeira estrada de Vila Lobos em Paris.

Assistir popular brasileira compõe-se das seguintes peças: Mazurca-choro, Schottisch-choro, Valsa-Choro, Gavota-Choro e Chorinho.

As peças são todas muito simples, nenhuma inovação especialmente importante, tanto em nível da realização puramente técnica quanto em nível do desenvolvimento musical aí se encontram. As pulsações rítmicas da gavota, valsa, schottish e mazurca na Suite Popular Brasileira são espelhos do caráter ora nostálgico, ora gracioso da música popular instrumental da época. Evidentemente, estas peças já apresentam elementos musicais mais ricos em relação àqueles utilizados pelos compositores populares, mas em sua essência nada é diferente.

A Mazurka é uma dança polonesa originária da Mazôvia. Dança ternária rápida. (160-180) em 3/4, a Mazurka se caracteriza por um deslocamento do acento sobre os tempos fracos do compasso (segundo ou terceiro tempo), assim como pela abundância de tercinas, pelo ritmo pontuado e pelos grandes intervalos melódicos. amazon fica tenho acompanhamento ‘bourbo’ feito por uma sucessão de quintas. Como dança popular, amazon arcanjo era conhecida deixe de o século 16 mas ela só entrará no repertório de dança da nobreza da burguesia depois de 1600 e assim mesmo numa forma estilizada como música erudita. a primeira denominação da dança Mazur aparecerá entretanto somente no século XVIII.

O povo dançava a ‘Mazur’ com muito entusiasmo e lhe dava denominações diversas, todas ligadas etimologicamente às evoluções dos casais: ‘obracany’, a dança que se roda, ‘obertas’, ‘oberek’, ‘drobny, a pequena dança, etc.  O Oberek é a variação mais rápida da ‘Mazur’. Em 3/8, com uma pequena melodia ornamentada e grandes saltos melódicos, às vezes de nona. O ‘Kujanyak’ é a variação lenta também chamada ‘Okragly. Muito lírica, permitindo  movimento em rubato, sua melodia é conduzida por plataformas sucessivas. Frequentemente no modo menor a Okragly tem uma construção simétrica.

Foi nesta última forma que Villa-Lobos se inspirou para compor sua Mazurka-Choro, escrita em lá menor e estruturada da seguinte maneira: A – B – A – C – A – coda.

No primeiro tema, a sexta napolitana se identifica completamente com a música dos chorões. este tipo de em cabeamento harmônico tornou-se lugar comum na música popular instrumental do rim de janeiro do início do século XX. O tema propriamente dito é uma modinha muito simples apresentada de maneira clássica, quer dizer, melodia, acompanhamento e base harmônica.

Foto 1

O segundo tema é apresentando na relativa a maior e parte sobre o acorde da dominante.

Foto 2

O terceiro tema, na tonalidade homônima ao primeiro, retoma o mesmo material temático deste, invertendo o contorno melódico.

Foto 3

Na coda, um novo motivo é utilizado. Trata-se de uma sucessão de tercinas onde o intervalo entre as notas é uma quarta. As notas mais agudas dessas tercinas fornecem uma melodia à parte (em semínimas) que se movimenta por graus conjuntos.

Foto 4

A Schottish é uma dança a dois tempos tirada da escocesa. Ela é executada como uma valsa rápida e entre 1830 e 1840 esteve muito em moda na Alemanha. Ela leva igualmente o nome de Valsa Escocesa. A Schottish foi progressivamente substituída pela Polícia, que possui um rítmo idêntico.

A Schottish-Choro de Heitor Villa-Lobos está escrita na tonalidade de mim maior e tem uma estrutura semelhante àquela da Mazurka, sem a coda. Sua configuração rítmica faz com que ela tenha um caráter mais pesado, assim como uma fanfarra.

Foto 5

A segunda seção foi composta na tonalidade relativa menor e mostra o último distinto.

Foto 6 (96)

O tema da terceira seção aparenta-se, de certa forma, àquele da segunda. Ele está na tonalidade da sobre dominante e sua melodia principal desenvolve na região média do quadro harmônico.

Foto 7

A grosso modo, a Valsa é uma dança rápida, escrita em compasso ternário, que utiliza na sua configuração melódica valores simples e compostos (da mínima à colcheia). No acompanhamento harmônico, o que lhe é mais característico, armação rítmica é feita a partir de um baixo sobre o primeiro tempo (representado por uma mínima pontuada) e de dois acordes iguais colocados sobre o segundo e terceiro tempos (representados por seminimas). uma antecipação muito Sutil e uma certa elasticidade no segundo tempo lh dá um balanço bem particular. O termo valsa deriva do termo alemão ‘walzen’, que significa rodar, dar voltas. É mais ou menos por volta de 1700 que a valsa entra na moda e sua maneira de dançar atrai a atenção da burguesia e da nobreza. A forma como os pares se enlançavam ficavam em completa oposição à rigidez das cerimônias dançantes da sociedade da época, como o Minueto, por exemplo. Durante o período o período da História da Música que estamos habituados a chamar de Romantismo, vários compositores retomam o rítmo para escrever Valsas de Concerto onde o andamento varia do muito rápido ao lento.

A Valsa-Choro é do tipo lento e melancólico, qualidade inerente à Valsa Brasileira. Sobretudo valsas cantadas pelos boêmios contemporâneos e amigos de Villa-Lobos. Ela está dividida em cinco sessões, com a mesma estrutura das peças precedentes. Sua tonalidade principal é mi menor e o tema da primeira sessão sai de um motivo estático sobre o acorde de tônica.

Foto 8

A segunda seção, na subdominante, apresenta um tema em mínimas no centro da harmonia, tema que será desenvolvido na região aguda do instrumento.

Foto 9

A terceira seção apresentando tem uma distinto, sobre acordes, na subdominante maior. Um pequeno clichê técnico é utilizado durante o desenvolvimento.

Foto 10

A Gavota é uma dança de origem francesa que data do final do século XVI. Pode ser escrita em 2/4 ou 4/4 com ou sem anacruse. Ela é construída por reprises de 48 compassos educada e pequenos saltos, com uma grande variedade de figuras: ‘jeu du baiser,’ ‘du bouquet’, etc. No século XVII, a Gavota passa a figurar na Suíte Instrumental e torna-se muito apreciada pelos alaudistas e cravistas. No século XIX a Gavota é ainda uma dança de salão e já possui um número incontável de variedades.

A Gavota-Choro de Villa-Lobos é talvez a peça menos interessante na série. Tendo as mesmas seções que as peças precedentes, ela se desenvolve sobre três tonalidades diferentes: ré maior, si menor e lá maior. não existem contrastes entre os três temas que são apresentados da mesma forma, com as mesmas figuras rítmicas. Esta é uma das principais razões da sua falta de graça. Comparemos, pois, os três temas que compõem a Gavota-Choro:

Fotos 11

Da Gavota-Choro tiramos um pequeno clichê técnico, que em 1929 tornou-se um material essencial para a composição dos 12 Estudos de Villa-Lobos. Vejamos exemplo:

Foto 12

A palavra ‘chorinho’ é uma apelação afetuosa, que foi introduzida no vocabulário musical somente para designar uma forma musical. Na configuração rítmica do ‘chorinho’ encontramos alguns elementos que serão utilizados no ‘Choro N.’ 1. Mas em relação ao chorinho popular, o ‘Chorinho de Villa-Lobos mostra algumas diferenças significativas. Lembre-se todos que o material temático e rítmico do chorinho é uma mistura dos elementos constitutivos da Polca e do Lundu.

É mais ou menos por volta do final dos anos de 1920 que a concretização dessa mistura se efetua dando nascimento a um novo rítmo: o Maxixe. O Maxixe torne-se o ponto alto de todos os bailecos populares e a forma de dançá-lo em bamboleios concomitantes deixa as famílias tradicionais completamente escandalizadas.

O ‘chorinho’ tem uma estrutura que difere integralmente daquelas empregadas nas outras peças da Suíte. O chorinho tem três seções e dois temas (o primeiro em dó maior e o segundo em lá maior). Na primeira seção, logo no início da peça, destaca-se um motivo que consiste na combinação rítmica de um baixo executado pelo polegar da mão direita, com acordes em movimento cromático. Este motivo rítmico, na extensão de quatro compassos, é utilizado por Villa-Lobos à guisa de introdução.

Foto 13

O tema propriamente dito aparecerá no quinto compasso; trata-se de um tema muito simples, quase infantil, onde encontramos algumas semelhanças com outros temas populares brasileiros.

Foto 14

O ‘chorinho’, em relação às outras peças de Suite, tem uma harmonização bem mais rebuscada (paralelismo de acordes e movimentos cromático entre as notas).

Na segunda seção (Piu mosso – em lá maior), o tema é introduzido de maneira semelhante, quer dizer, precedido de um movimento rítmico sobre o acorde de tônica formando uma pequena introdução de seis compassos:

Foto 15

O tema desta seção, construído sobre acordes, assemelha-se muito a um movimento de fanfarra, o que é bastante compreensível conhecendo a paixão de Villa-Lobos por esse gênero de formação instrumental. Quando seguimos atentamente o tema desta seção temos a nítida impressão de ouvir uma pequena fanfarra com as madeiras e os metais transpostos para o violão.

O Choro N. 1

“O Rio de Janeiro do fim do século passado apresentava uma variedade musical curisíssima: o Choro. A Rapaziada boêmia the então costumava formar pequenos grupos instrumentais que alegravam os bailes nas casas de família e animavam as festas de São Silvestre, Santo Antônio, São João São Pedro e Santana. Os chorões prestavam também seu concurso aos aniversários, batizados casamentos e durante o carnaval percorriam os bairros da Cidade Nova, Praça Onze e centro da cidade, arrancando entusiásticos aplausos da multidão, que em romaria os acompanhava bisando quase todos os números.” (1)

“Os músicos, na sua maioria, faziam ponto nas casas de chá na rua dos Ourives, 50, de propriedade de Buchmann Guimarães e Beviláqua; no Moreira, à rua Gonçalves Dias, no Cavaquinho de Ouro, na rua da Carioca e na Rabeca de Ouro, na mesma rua. Nos botequins encontravam-se frequentemente os malandros chorões cantando modinhas e assobiando ao ouvido de outros entusiastas.

“Findo o baile, alta madrugada, o choro saia tocando uma polca dengosa e o pessoal mergulhava no primeiro botequim que encontrava aberto. O português gorducho, do ano do estabelecimento, já sabia e perguntava logo: ” – Então, o que vai? Uma gemada com vinho do Porto ou uma boa misturada?” Cada um escolhia a bebida de sua predileção havendo quem preferência o rabo-de-galo, que era uma mistura de parati, mel de abelha e canela. O sol invadia o botequim e a flauta ainda se fazia ouvir acompanhada do cavaquinho e do violão. O botequim enchia-se de seresteiros que vinham de outros forrobodós e o choro tocava até às 9, 10, 11 horas.”. (2)

“Muitas vezes, na casa brasileira, as escondidas do papai conservador e tradicionalista, as nossas sinhazinha sessões não só cantavam o que canalha tanta pela rua como dançam umas com as outras divertidas e alegres, os passos do corta-jaca ou do balão-caído, que aprendem pelos teatros que frequentam. É o fruto proibido saboreado à socapa, num despertar gostoso dos instintos da raça. E que ninguém se espante, ainda, sabendo que esse papai conservador e tradicionalista, que não quer em sua casa tocata de violão e passos de maxixe por sua vez pondo a gravata de plastron, diante do espelho de cristal, também ensaia, venturoso, de quando em quando por instinto e prazer, motivos do bailando nacional. Isso, quanto ao maxixe, porque quando rebenta na calçada na rua, por horas em que todos dormem, a voz da serenata, soluçando, gemendo, na doçura da noite cheia de luar e de mistério, ele é o primeiro a abandonar o leitor onde repousa e ir pé ante pé, colar ou ouvindo atento a frincha da janela, gozando, em êxtase, o canto que lá fora soluça amargurado.

“No Rio da assomada do século não se compreende lua no céu sem serenata, sem violão e sem cantigas. Atenção, porém, que a serenata está na rua.”

Quando a cidade adormece, por ermas ruas e revés caminhos, andam grupos de seresteiro da cantar. Em grupos numerosos, lá vão eles, ferindo violões, cavaquinhos, bandurras e bandolins, oi chapéus desabados no sobrolho, nos bolsos dos paletós, frascos da “branca” ou vinhaça. Andam léguas e léguas assim a tocar, a cantar até que venha a luz do dia.”

“De dois gêneros são as serenatas que se fazem entre nós: a serenata de cantigas e aqui se denomina Choro. Na primeira avulta a voz humana e na segunda a voz humana não se escuta e só os instrumentos é que criam; uns a melodia, outros, a harmonia, conjugando-se em original e íntimo concerto. No primeiro dos grupos, no dos contadores seresteiros, entoam-se cantigas, em geral gemedouras, tristes e cantochânicas; no segundo, Mazurka, polcas, valsas e quadrilhas, solda que se desfere, outrossim, em adágio plangente, porque na época o sofrimento é flor que se cultiva com prazer. No bando dos seresteiros, formam os violões, os cavaquinhos, os bandolins e outros instrumentos de corda; no outro bando, além desses, os instrumentos de sopro; oboés ofcleides, flautas, clarinete e até trombone e pistões. No repertório dos chorões estão as valsas longorosas de Kalu e Anacleto, as polcas e lundus do Calado e Viriato, os sincopados tangos de Ernesto Nazareth e do Costinha, as schottish de Irineu de Almeida, Aurélio Cavalcante e Dantas, músicas patéticas, adocicadas, que os instrumentos suspiram melosamente a escorrer ternura, provocando suspiros e saudades. (3)

São de Renato de Almeida as palavras que se seguem: – “Choro é um nome genérico com várias aplicações. Pode designar um conjunto instrumental, em geral com flauta, ofcleide, bandolim, clarineta, violão, cavaquinho, pistão e trombone com um deles solando. Por extensão chamam-se choros também as músicas executadas por esses grupos instrumentais que acabam tomando aspecto próprio e característico. Por fim, o choro é a denominação de certos bailaricos populares, também conhecidos por ‘Assustados’ ou Arrasta- pés’. Essa parece ter sido mesmo a origem da palavra, conforme explica Jacques Raimundo, que diz ser originária da Contra-Costa, havendo entre os cafres uma festança, espécie de concerto vocal com danças chamado ‘xôlo’, expressão que por confusão com a parônima portuguesa passou a dizer-se xôlo e, chegando a cidade, foi grafada ‘choro’ com ch. Como vários expressões do nosso populário logo a forma diminutivo de chorinho.

“O choro é carioca. Veio da Cidade Nova por volta do meado do século passado e depois se tornou coisa muito nossa. Antigamente era comum ouvi-lo pela noite afora, passeando pela ruas em intermináveis serenatas. (4) Os choros  tocavam músicas populares comuns a que depois deram um traço próprio e uma expressão típica. Foi um dos fatores que mais contribuiu para a fixação dos elementos da música carioca. se em geral é sentimental muitos são alegres respeitados como aquele magníficos ‘Apanhei-te cavaquinho’, de Ernesto Nazareth. (5)

“Villa-Lobos pertenceu a um grupo de seresteiro de escol. Seu quartel-general era o Cavaquinho de Ouro, na rua da Carioca, onde recebiam convites de toda espécie para tocar no lugares mais diversos. Faziam parte do grupo, cujo chefe era Quincas Laranjeiras os seguintes chorões: Luiz de Souza e Luiz Gonzaga Horta (pistão-baixo), Anacleto de Medeiros (saxofone), Macário e Irineu de Almeida (ofcleide), Zé do Cavaquinho (cavaquinho), Juka Kalu, Spíndola e Felisberto Marques (flauta). O repertório abrangia a peças de Calado, Nazareth, Luiz de Souza e Viriato”.

“Villa-Lobos tirou do chorões ambiente para criar uma atmosfera nova de música. Naquele meio, formou uma faceta da sua personalidade, aproveitando o que havia de original. Entre os chorões, Villa-Lobos era o violão clássico e chegou o mesmo a influenciá-los, pois à sua sugestão, Nazareth escreveu Batuques, Fantasias e Estudos.” (6)

O Choro N. 1 é a melhor homenagem que Villa-Lobos poderia prestar a seus amigos de ‘roda,’ e a ele mesmo. Villa-Lobos foi um músico que teve também uma formação musical popular e mesmo após seu triunfo como compositor jamais camuflou esse seu lado.

A denominação ‘Choro’ não deve ser vista como uma forma de música popular. como foi descrito algumas linhas antes o sono representava antigamente um grupo de executando de instrumentista que tinham polcas, valsas, schottish no seu repertório. Em seguida a palavra choro designou um certo rítmo. o choro como forma musical segundo o conceito atual é coisa mais recente e pode ser assim me lado ao rondó em cinco seções.

O choro, no seu conceito antigo, constitui-se basicamente de flauta, violão e cavaquinho. A estes instrumentos somavam-se, dependendo da circunstância, o ofcleide, o trombone, a clarineta, o saxofone e o trompete. Dois instrumentos de percussão foram introduzidos: o pandeiro e o surdo.

Dos grupos de choro tradicionalmente estabelecidos fazem parte dois violinistas tocando instrumentos distintos. O primeiro realiza uma espécie de baixo contínuo que tem a função de contrapontear com a melodia e preencher as lacunas dos finais de frase. Esse instrumento tem uma sétima corda suplementar (dó) e o executante utiliza-se de um mediador preso ao polegar (dedeira) para ferir as cordas. Os dedos, i, m, a formam uma unidade para os desenhos rítmicos do acompanhamento harmônico. O segundo, que se utiliza de um violão clássico normal’ ocupa-se, sobretudo, dos encadeamentos harmônicos e do rítmo. Às vezes segue as ideias melódicas do primeiro no movimento de terceiras paralelas.

Existe um terceiro tipo de violão também empregado no choro, mais raramente, denominado violão tenor. o violão taylor tenho tamanho de um violão clássico normal, porém com quatro cordas somente. Seu executante desempenha o papel de solista, assim como o de acompanhador seguindo os desenhos melódicos dados pelo violão de sete cordas.

O choro N. 1 de Villa-Lobos é um choro estilizado, que procura colocar em evidência, através de fermatas e acelerados inesperadas o caráter brincalhão do gênero. A primeira seção em mi menor, a segunda em sol maior e a terceira na tonalidade homônima da principal.

Como estilo de composição, o Choro N. 1

Foto 16

Harmonicamente, o Choro N. 1 segue muito perto aquilo que ficou tradicionalmente estabelecido. A primeira seção em mi menor, a segunda em sol maior e a terceira na tonalidade homônima da principal.

Como estilo de composição, o Choro N. 1 aproxima-se bem daquilo que era feito pelos violinistas populares contemporâneos de Villa-Lobos. O exemplo mais marcante talvez seja o de João Pernambuco.

O Choro N. 1 foi escrito em 1920 e trata-se da primeira obra de uma série de 14. Encontra-se na instrumentação dos choros desde a peça para instrumento solista (Choro N. 1 e Choro N. 5) até a mais completa formação instrumental (grande orquestra, fanfarra e coros no Chorou N. 14). Os 14 choros juntos foram uma só grande obra para a qual Villa- Lobos sentiu necessidade de compor uma espécie de prólogo. a concretização dessa ideia está na Introdução aos Choros (para grande orquestra). Escrita em forma de abertura, a Introdução aos Choros utiliza o material musical dos Choros 3, 6, 7, 9, 10 e 12. Ao final dessa Abertura aparece em primeiro plano o violão. Ouvimos uma cadência “as libitum), que prepara a entrada do Choro N. 1.

Foto 17

Segue…

(1) Vasco Mariz – Heitor Villa-Lobos, compositor brasileiro.l – MEC/ DAC/ Museu Villa-Lobos, 1977

imprensabr
Author: imprensabr