Leonor Bianchi
Hoje o mundo da música, sobretudo, do choro e do violão celebram o legado deixado por Horondino Silva, o Dino 7 Cordas.
Carioca do Santo Cristo, zona portuária do Rio de Janeiro, Dino teve reconhecidamente o dia 5 de maio de 1918 como data do seu nascimento, embora só tenha sido registrado três meses depois, em 5 de agosto. Mas ele próprio dizia que a data correta do seu nascimento era 12 de outubro.
Bom, já que ele teve três datas de nascimento… celebremos sua vida e sua obra nas três datas, então, sendo uma delas o dia de hoje!
A Revista do Choro destaca o nome e a obra deste gênio que revolucionou a linguagem do violão popular no Brasil e por mais de quarenta décadas construiu uma nova linguagem para o violão de 7 cordas no choro, deixando reconhecido trabalho de evolução do instrumento nas páginas história da música.
Autodidata, já tocava violão de seis cordas, de ouvido, desde os sete anos de idade só de observar seu pai tocar o instrumento.
Por anos ele não conheceu a sétima corda do violão, mas foi com Arthur de Souza Nascimento, conhecido como Tute (1886 – 1951) grande difusor do 7 cordas no Brasil e conhecido também por ter sido o músico que indicou Pixinguinha, quando este ainda tinha apenas com 15 anos, para tocar na orquestra de Paulino Sacramento, no Cineteatro Rio Branco, no Rio de Janeiro, que Dino descobriu o sete cordas.
Humilde que era e detentor de uma serenidade como poucos, Dino tinha bastante paciência. Foi apenas em 1951, após a morte de Tute, maior referência no instrumento no Brasil e no choro até então, já estando há 15 anos no Regional de Benedicto Lacerda e também de já ter integrado o regional de Canhoto, o cavaquinista Waldir Frederico Tramontano, é que Dino passou a experimentar o violão de 7 cordas, tendo mandado fazer seu instrumento na loja ao Bandolim de Ouro, na virada de 1951 para 1952. Violão este que o acompanharia até o fim de sua vida.
Ao lado de Meira, Jayme Florence, formou a maior dupla de violão já conhecida da música popular brasileira, especificamente do choro.
Dino integrou a primeira formação do Conjunto Época de Ouro e participou de todas as gravações que Jacob do Bandolim realizou na RCA Victor, de 1949 a 1969.
A revolução que ele criou para o instrumento refere-se ao desenvolvimento de uma nova técnica e de uma nova linguagem; o que é chamado nas rodas de choro de baixaria – uma espécie de contraponto melódico nas cordas mais graves do violão.
Dino demorou ainda um ano e meio para gravar com o regional do Canhoto tocando o seu sete cordas, pois não se sentia seguro ao instrumento. Mas tão logo se familiarizou com a sétima corda, rapidamente superou aquele que o havia inspirado, Tute, mas que em vida não foi seu mestre tampouco um amigo musical com quem poderia dividir e compartilhar conhecimentos sobre o violão de sete cordas.
Autodidata, Dino só foi estudar música aos 24 anos com seu amigo Veríssimo, que não era lá essas coisas como professor nem como instrumentista na flauta e ao piano, mas foi quem o ensinou as primeiras noções de solfejo e harmonia. As aulas foram interrompidas para que seu professor atendesse a convocação para ser pianista em uma das embarcações brasileiras que representaram o país na Segunda Guerra Mundial. Incrivelmente, ainda que a participação do Brasil e das forças armadas brasileiras tivessem sido discretas na guerra, a embarcação na qual viajava Veríssimo, professor de Dino 7 cordas, foi bombardeada e naufragou. Após este fato, hoje considerado inusitado, Dino percorreu o seu próprio caminho para estudar música.
Foi seu próprio mestre, tendo acompanhado os maiores artistas do rádio brasileiro, como Carmen Miranda, Francisco Alves, Sílvio Caldas, Isaura Garcia, as Irmãs Pagãs, Augusto Calheiros, Linda Batista, Gastão Formenti, Carlos Galhardo, Almirante, João Petra de Barros e muitos outros, além de ter tocado nos regionais já mencionados neste artigo.
Na década de 1980 o violonista já havia gravado com praticamente todos os músicos brasileiros das paradas de sucesso. Ele acompanhou Elizeth Cardoso, Paulinho da Viola, Clara Nunes, o chorão Abel Ferreira, Clementina de Jesus, Elton Medeiros, Joel Nascimento, João Nogueira, João Bosco, MPB4, Beth Carvalho, Francis Hime, Monarco, Elza Soares e Gilberto Gil, As Frenéticas, Cartola, Ângela Rir, Pixinguinha, Agepê, Raul Seixas… só para vocês terem ideia!
Foi um período em que o nome de Dino 7 Cordas aparecia em praticamente todas as fichas técnicas dos LPs que eram lançados no mercado. Seu violão de 7 cordas já estava estabelecido, e até a chegada do jovem Raphael Rabello, que teve nele sua maior influência, dominou as gravações de sete cordas e as apresentações ao instrumento.
Falando em apresentações, foi apenas no final de sua carreira artística, que ele e seu grande admirador Raphael Rabello tocaram juntos pela primeira vez. Era um projeto musical da Brahma Extra no qual o Rafael era homenageado. Rafael se apresentava com o filho de Dino, o Dininho. Num dado no momento do espetáculo Dino subiu ao palco para fazer uma rápida apresentação e tocou seis músicas em duo com Raphael Rabelo. Isso aconteceu em 1989. No ano seguinte a dupla de violões de 7 cordas que ainda nunca havia subido junta num palco tinha 12 apresentações marcadas. Eram espetáculos para um público segmentado do Mistura Fina, em Ipanema, e no Rio Jazz Club, no Leme, zona sul do Rio de Janeiro e Raphael Rabello não ensaiou para os primeiros quatro shows que faria com Dino.
Em compensação a performance apresentada pelo duo nas apresentações do Rio Jazz Club que vieram depois estavam tão boas, que motivaram o alemão Peter Klam, dono de um pequeno selo fonográfico chamado Caju Music a convidá-los para gravar um disco durante uma das apresentações naquela casa de shows. Os músicos aceitaram instantaneamente a proposta, mas o equipamento de captação não conseguiu registrar o áudio de forma primorosa como todos gostariam, e para quê a gravação daquela dupla fosse registrada como um momento ímpar para a música universal o produtor resolveu levá-los para um estúdio, e entre dezembro de 1990 e Janeiro de 1991 eles gravaram o disco histórico ‘Raphael Rabello e Dino 7 Cordas” pela Odeon. Era a primeira vez que seu nome, Dino 7 Cordas, aparecia na capa de um disco. Ele contava que já havia recebido diversos convites para gravar discos solo, mas que gostava de fazer apenas aquilo que dominava com perfeição, ou seja, acompanhamento, e por isso nunca havia gravado um disco sozinho.
O disco foi lançado em abril de 1991 com tiragem de apenas 4.500 exemplares no mercado brasileiro, japonês e europeu.
E Dino continuaria gravando e trabalhando.
Pouca gente sabe, mas Dino atuou como produtor musical. Produziu e arranjou (e tocou sete cordas) o primeiro disco do Cartola, lançado em 1974 pela Gravadora Discos Marcus Pereira, e o de 1975 também. E era compositor. A cantora Isaurinha Garcia gravou dele ‘Choro dos Olhos Castanhos’ e ‘Aperto de Mão’.
Faleceu no Rio de Janeiro, em 27 de maio de 2006, aos 88 anos